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7 de setembro de 2013

Livro (Em Processo) - Capítulo Dez d'Os Guardiões de Tarkataz

X
Uma roseira no gelo

A névoa fina da manhã ia se dissipando sob os primeiros raios de sol. Cachorros corriam pela praça do mercado a alguns metros abaixo. Através de suas pálpebras cansadas Hector observava a praça do mercado. Ergueu os olhos para as montanhas e ficou a admirar a beleza das rochas nuas enquanto dois de seus escravos o vestiam com as suntuosas vestes brancas e vermelhas do senado.
A mobília de madeira do quarto emanava um aroma delicado, como uma floresta úmida de orvalho. Um incenso exalava sua fragrância, enchendo o quarto com mais um cheiro, além do suor dos escravos, da comida da cozinha, da maresia do mar, do limo das pedras...
Enquanto o tecido leve deslizava sobre seu corpo nu, cobrindo-o, Hector refletia sobre a vida, sobre a guerra e sobre o futuro da república que ele tinha o intuito de melhorar.
Fora do quarto passos se aproximaram da porta. Era Narbo, seu escravo leal e o mais inteligente que conhecia. Com exceção de algumas poucas vezes, Narbo sempre acompanhava Hector, onde quer que estivesse. Fazia serviço de escriba, conselheiro, médico e tudo o mais que viesse a ser necessário. 
Ele era praticamente da mesma idade de seu senhor, tendo apenas alguns cabelos brancos.
- Senhor, mais três fazendeiros venderam suas terras e deixaram a cidade – disse ele com uma pequena folha de pergaminho na mão, presa a uma tábua. Sua voz era mais aguda do que sua idade determinava, mas não chegava a ser histérica. – Os números só fazem crescer.
- Bom dia Narbo... – resmungou Hector virando-se para o velho homem.
- Perdão. Bom dia senhor, veja...
- Pelos deuses! Problemas já a essa hora da manhã, o sol sequer surgiu inteiro. Maldita hora para o frasco se partir, esta pirataria deve ser estorvada.
Narbo o observava quieto, enquanto os dois escravos que o vestiam punham a faixa vermelha em seu ombro.
Andando na direção dele, Hector continuou. Com uma expressão desiludida disse:
- Continue dizendo o que tinha a dizer. Só me resta ouvir...
- Bem, alguns ex-senadores que apoiavam Túlius partiram durante a noite com seus pertences, família e escravos – disse Narbo, olhando então o papel em suas mãos e passando o dedo pelas linhas manuscritas completou – Dentre eles Adalberon, Damilis e Remus.
- Remus? – exclamou Hector indignado. Sentando-se na beirada da cama de mogno. – O que ele tem para me temer? O que ele espera que eu faça?
- Talvez ele pense que você deseja vingar-se das suas traições.
- Ah Remus... tolo Remus. Mande-os uma carta dizendo-os que voltem.
- A todos eles?
- Sim, a todos os que partiram. Escreva que eu, Hector, imperador de Orull, prometo tratá-los com o respeito com que trato qualquer outro amigo ou familiar. Seus cargos de senadores não serão retirados, nem nenhum de seus bens confiscados, ou qualquer um de seus familiares ameaçados ou perseguidos. Desde que eles não tenham em mente algum ato contra mim ou contra a república eles estarão são e salvos em meus braços e não precisarão ficar receosos com sua estadia em Orull. Escreva o seguinte ao fim: “A república está frágil como uma roseira na neve. E para que ela possa florescer é necessário que todos os homens orulianos trabalhem juntos para cuidar da delicada planta que é a nossa pátria. E eles são um  desses homens que eu preciso ao meu lado para dar-me suporte e força para cuidar da roseira até que chegue a primavera e ela possa seguir sozinha.”
Enquanto Narbo escrevia apressadamente o que Hector dizia a luz do sol adentrou completamente o quarto. E o incenso se consumiu transformando-se em apenas cinzas.
- A propósito... – disse Narbo mudando de assunto.
- Mais problemas? – Irritou-se Hector.
- Não, não... pelo contrário – disse Narbo sorrindo. – A reunião com os soldados, ontem de manhã correu perfeitamente. Todos os homens selecionados dispuseram-se a partir, comandados pelo capitão Victor Leonars. Embarcaram ontem mesmo e devem estar chegando neste momento.
- Ótimo! – Exclamou Hector, sorrindo radiante. – Todos se orgulharão disso ao retornarem como heróis, sem dúvida. E nossa pátria voltará a prosperar. Mas agora, vamos comer alguma coisa, estou faminto.
Ao terminar, os dois, junto a alguns escravos que esperavam do lado de fora, desceram as escadarias que os levava até o saguão, passando por alguns outros quartos e corredores. Às grandes portas de carvalho, entalhadas com diversos ramos foliados que se entrelaçavam em espirais intermináveis, uma guarda de vinte lictores aguardava a saída de Hector para levá-lo até o prédio do senado.
Entretanto, ao invés de seguirem até a porta, foram até o pátio, passando por pilastras cinzentas de ardósia azulada, espiraladas até o teto, com cerca de dois metros de altura, onde se contorciam em volutas beiradas de ouro.
O pátio era alguns degraus mais baixo do que restante do primeiro piso do castelo, que ao todo tinham três pisos utilizáveis, o restante se resumia a grandes torres, que eram usadas por magos em guerras, embora nunca tenham sido necessárias. A construção tinha sido feita em grande parte através da magia, durante a era da magocracia, há décadas atrás. Ainda se desconhecem todas as passagens do castelo. Recentemente um dos escravos afirmou ter encontrado uma passagem que levava até uma sala que roncava.  Mas o ronco vinha de algum lugar atrás de uma parede, onde não se podia chegar. 
Caminhando vagarosamente Hector sentou-se na mesa de madeira perto de chafariz, enquanto observava pássaros e borboletas brincando pelos arbustos e árvores do jardim. O pátio era enorme, e lá havia uma infinidade de plantas: roseiras, parreiras, pessegueiros, romãs, cerejeiras, tulipas, copos-de-leite, e uma infinidade de outras plantas. O homem que as havia plantado e arranjado em canteiros fizera, sem dúvida, um ótimo trabalho.
Hector observava ao redor, reparando minuciosamente em cada detalhe que lhe cercava. Esforçava-se ao máximo para abstrair dos pensamentos revoltos que o afligiam ultimamente. Passava os olhos analisando as curvas das estátuas que enfeitavam os canteiros, e ficou a maior parte do tempo observando uma jovem bela, nua, esculpida em um mármore levemente rosado, que lhe avivava, tanto, que podia se passar por viva.
O imperador se concentrou na figura da jovem que estava em total harmonia com o jardim ao redor. Finos ramos lhe cobriam o corpo, trepadeiras lhe subiam até a panturrilha exibindo minúsculas flores amarelas. Sobre sua cabeça o pessegueiro lhe lançava a sombra. O que mais chamou a atenção de Hector era a roseira que nascia por detrás dela. Suas pétalas tinham o mesmo tom da pele da jovem moça de cabelos longos, e um de seus botões crescia entre suas mãos de tal modo estavam ligadas, planta e garota, que dada a sua posição parecia que ela puxava a flor para si, afim de sentir seu aroma.
- Aqui está sua comida meu senhor – disse um escravo apoiando uma grande travessa com geléias, pães, mel, vinho, chás, frutas cortadas e fatias de bolo e tortas.
- Onde está minha mulher? – Perguntou ele a Narbo, sem mover nenhum músculo além dos que precisava.
Erguendo uma sobrancelha, este, que estava a alguns metros atrás de Hector respondeu:
- Ela viajou, ontem pela manhã, para Gondelhan senhor. Com suas escravas, para fazer compras... Não está lembrado? – perguntou ele tentando não expressar irreverência ou desrespeito. – Voltará esta tarde.
- Ah... – foi a resposta de um indiferente e transtornado Hector.
- Senhor, espero que esteja bem, deseja algo além do que lhe foi dado?
- Não Narbo, estou bem. Sente-se comigo e coma algo, me sinto sozinho, é só.
- Se assim deseja – respondeu ele, e sentou. – Se quiser conversar sobre algo que lhe atormenta, esteja à vontade.
Passado alguns segundo, sem nada comer, Hector levantou-se e caminhou ao redor do chafariz, até parar frente a frente com a jovem.
- É estranho...  – disse ele à Narbo, que se levantara e o seguia. – Pensam em mim como um tirano, não era minha intenção a morte de meu amigo Túlius. Eu o perdoaria. E agora Remus, que eu considerava como um filho para mim. Estão todos se afastando, me temendo. 
Fez-se uma pausa.
- Eu não devia estar me questionando sobre essas coisas, sei que minhas intenções são as melhores para o bem da república. Você sabe. Não sabe? Narbo.
Mirando sua nuca, assustado, Narbo afirma com um sussurro e repete em voz alta:
- Claro senhor! Reconheço suas ações, dignas elas são, sem dúvida... sem dúvida.
- Preciso mostrar a todos minhas verdadeira intenções. Evoluir, engrandecer, melhorar e fazer prosperar a república. Quero justiça e paz para todos.
- E isso terá. Use suas palavras hoje no senado, se suas palavras não forem o bastante, ainda tens um exército pronto para lutar ao seu lado.
Virando-se radiante, encarando Narbo disse, recobrando sua altivez:
- Tem toda a razão. Obrigado Narbo, não se esqueça das cartas. Tenho trabalho a fazer.
Deixando o pátio, Narbo e a jovem moça para trás, Hector caminhou em passos largos até as grandes portas, onde os lictores sentados se levantaram rapidamente, e abriram passagem para ele, que saiu para o mercado barulhento sendo cercado pelos vinte homens. Muitas pessoas paravam para olhar a comitiva passando por entre as barracas. Hector sorria para o povo que ou lhe acenava alegremente, fazendo reverências e assoviando, ou cuspiam no chão disfarçadamente fechando a cara.
Subindo os degraus do senado os lictores se espalharam postando-se dois a dois entre as colunas, com seus escudos defendendo-lhes o ventre e o tórax.
Hector adentrou a sala redonda, guardada por alguns soldados, no corredor ainda havia alguns senadores, patrícios velhos representantes de importantes famílias. Lá dentro uma grande cadeira que se assemelhava a um trono fora posta no topo de dois degraus, destinada ao traseiro de Hector, desde que fora nomeado imperador, por pressão ao senado.
Nas paredes havia fileiras de bancos de pedra que acompanhavam seu formato circular, como na Arena. Alguns senadores já estavam em seus lugares, lá estava também o Senhor de Guerra Frederic, também leal à Hector. Com uma piscadela aquele o cumprimentou quando esse sentou-se na grande cadeira acolchoada.
Nesse instante os senadores começaram a assumir seus assentos, cerca de metade dos senadores, ou mais, não estava lá. O que acreditava Hector ser pelo mesmo motivo de seu grande amigo Remus. Mas ainda haviam muitos outros ligados a Túlius.
Um homem muito velho regia a reunião. Ele tinha a voz muito arrastada e rouca, seus cabelos rareavam e as rugas lhe cobriam todo o rosto.
- Com a palavra – começou ele, batendo com um cajado três vezes no chão. – o senado ouvirá primeiro o imperador Hector Fevirus Julian.
Os senadores calados observaram o imperador se levantar, apoiando-se nos joelhos. Parado no lugar, virou a cabeça em todas as direções, mirando fundo nos olhos dos homens que lá estavam.
- Senhores, - disse ele fazendo um sinal com as mãos. – nossa república tem andado enferma. Afirmo isso por conta das desigualdades explicitas nas nossas ruas – pontuando cada frase, Hector impunha sua voz ecoante, dando um espaço para mirar os homens em cada vírgula ou ponto. – Nosso povo sofre com a miséria, com a fome e com a doença. E eu não acho justo uma divisão tão desigual de poder. Eles são a maioria em nossa cidade, e merecem ser tratados com o mínimo de honra e dignidade...
Os homens começavam a se entreolhar, alguns cochichando. Levantando mais a voz, Hector prosseguiu:
- É por isso que estou aqui! Desejo proporcionar honra, paz, dignidade, igualdade, liberdade e direitos para os cidadãos. Esses atos de pirataria têm arruinado o comércio, e o povo está obviamente furioso por conta disso, sei que alguns de vocês também, e é por isso que foi mandada a nossa última tropa para a ilha de Tarkataz. Os Guardiões de Tarkataz eles são. E esperamos que obtenham sucesso em sua missão.
“Muitos de vocês lutaram contra mim, em minha tentativa de guiar Orull para a primavera dos tempos, onde a república evoluirá para um patamar nunca atingido, de glória e prosperidade. Mas isso não é mais um problema, pois aqui estamos. Eu convoco todos os aqui presentes para se unirem a mim nessa empreitada tão difícil para um único homem trilhar sozinho. Convoco o amor e lealdade de vocês pela pátria e pela república. Convoco a generosidade para com as classes miseráveis. Tudo o que desejo é guiar a república pelas estradas da igualdade, e da prosperidade.”
“Saibam que todos aqueles que estiverem ao meu lado terão as velhas desavenças esquecidas, contudo Orull jamais perdoaria um segundo ato desleal ou infiel por vossa parte. Pergunto-lhes, pois, quem está a favor e quem está contra a república?”
Os senadores estavam imobilizados... Alguns aceitaram de cara, batendo palmas com energia e vontade. Hector observava-os com um olhar quente como a lava que saía do Monte Flamejante. O ar se tornara pesado, ele falou coisas que seria impensável para os nobres, afinal, o que os diferia das outras classes era o que os interessava, fazer escravos, ter terras, dinheiro... Poder!
A proposta de igualdade, era o ato mais terrível que se poderia ter cometido, mas nenhum dos senadores jamais recusaria por conta da ameaça implícita em seu discurso. E ele sabia disso.
- A proposta foi aceita com unanimidade – disse o velho, com sua voz arrastada, depois que todos os senadores haviam batido palmas, sem nenhuma objeção. – Ouçamos então o restante.

- No senado, hoje, o imperador Hector Fevirus Julian decretou que cada cidadão de Orull receberá do tesouro público, amanhã,  em seu castelo, a quantia de cem moedas de prata! – Quem dizia isso era o arauto. Sobre as escadas do Senado, gritava, enquanto gesticulava com os braços, para uma multidão eufórica que pararam seus afazeres para ouvir a proclamação. – Além disso, algumas famílias merecedoras receberão fazendas na encosta da Cordilheira Sangrenta! – Mais gritos e vivas explodiram do povo. – E para concluir, no próximo ano, todos os aluguéis nas partes baixas da cidade serão pagos integralmente!

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