Sugestões, Pedidos e Dúvidas

Bem, espero que todos sintam-se livres para requisitar trabalhos específicos, sugerir procedimentos de postagem, fazer algum pedido ou tirar qualquer dúvida.

Agradeço pelas visualizações, mas agradecerei ainda mais pela participação no trabalho! Sintam-se livres para comentar e participar da construção das obras que serão para todos nós!

Se não quiserem fazer isso diretamente aqui, em alguns dos posts, há ainda a página no facebook



29 de janeiro de 2014

Educação - Questionar também é aprender?



Uma possível resposta.


Quando aconteceu aquela guerra? Qual o nome daquele personagem? Onde ocorreu tal evento?
Como funcionava determinada política? De que forma se deu esta revolução?

Estas perguntas costumam aparecer com uma frequência decepcionante nas aulas de história, seja das escolas, seja das universidades. Mas não acho que elas sejam um verdadeiro problema quando partem dos alunos, curiosos e interessados nas descobertas do passado, e no conhecimento que ele pode nos proporcionar. Quanto mais próximos do princípio de sua travessia pelos densos campos do conhecimento, mais comum é buscar pelas respostas prontas.

Contudo, é responsabilidade do bom educador, ao meu ver, mostrar aos alunos que este tipo de informação, pura e simplesmente, por mais interessante, ou importante que possa ser, não é o que nos ajudará a crescer, intelectual e socialmente. Por que elas, por si só, como meras informações, que podem ser facilmente encontradas em qualquer site ou enciclopédia, não contribuem para uma reflexão e um questionamento que nos leve a repensar nossos próprios conceitos, não necessariamente com o intuito de transformá-los ou sequer de adequá-los, mas, pelo menos, de legitimá-los. De pô-los e nos pormos à prova.

E, com isso em mente, o professor peca, quando, em suas avaliações, ou ao longo de suas aulas, demonstra e exige dos alunos as respostas para este tipo de pergunta, o que faz com que estes acreditem estar aprendendo o que vai lhes ajudar (ou não) mais tarde. Sendo assim, um Educador que se valha da disciplina História para educar outros seres humanos deve ter isso em mente.

Mesmo que exponha os fatos históricos, junto aos alunos, que julgue interessantes para a construção de um conhecimento posterior, e isso, muitas vezes, é fundamental, o Educador deve sempre atentar para a necessidade da reflexão, do questionamento, do aprimoramento da sensibilidade dos educandos para a compreensão das mais diversas culturas e sociedades, relações pessoais que se constroem dentro e fora delas, sabendo ainda que o que se vê nos livros ou nos filmes não passa de um ponto de vista, de modo a verificarem que, ao longo de um período de estudos debruçados sobre esta disciplina, educandos e educadores puderam construir, discutir, questionar, refletir sobre e observar em si e nos outros como este conhecimento foi absorvido, composto, modelado, dotado de diversos significados e igualmente capaz de dotar outros conhecimentos.

Isso que proponho, de forma alguma exige mais ou menos 'trabalho' de um professor, apenas supõe que ele abra mão de sua centralidade no espaço convencional de ensino, propondo uma participação mais ativa por parte dos alunos. Já que estes, com suas diversas vivências, informações e conhecimentos, além de, com suas personalidades, seus anseios e suas ideias, podem, e certamente vão, contribuir em muito para os debates e discussões que envolvam os mais diversos temas históricos.

Assim, as perguntas que expus no início deste trabalho sofreriam algumas mudanças e, ao invés da versão dada, teriam sua aparência mais próxima disto: Por que aconteceu aquela guerra? Por que o nome daquele personagem 'sobrevive'? Por que ocorreu tal evento? Por que funcionava determinada política? Por que se deu esta revolução?

Muito disso que escrevi, e que penso, vem sendo montado em minha cabeça à partir das experiências que tive junto à equipe de educadores do Projeto Construindo o Saber, onde leciono, também junto de meus maravilhosos companheiros e membros do Projeto Vivendo a História, e na universidade. Estes espaços riquíssimos de discussão permitiram e forçaram a minha reflexão sobre educação, me fizeram olhar para meu ensino básico e médio com outros olhos, para a minha vida, para minhas relações pessoais com o mundo.

E muitos dos meus atuais questionamentos giram em torno das seguintes perguntas: Por que vamos a escola/universidade? O que fazemos ou o que deveríamos estar fazendo lá? O que é conhecimento? Apenas "conseguimos" conhecimentos na escola/universidade? Por que dizem que provas avaliam Conhecimento? Qual a minha função enquanto educador? É possível chegar a uma "verdade" para cada uma destas perguntas?

É possível chegar a uma verdade?
 

20 de janeiro de 2014

Livro (Em Processo) - Capítulo Doze d'Os Guardiões de Tarkataz



XII

Promessa partida

Quando todos estavam prontos, Victor reuniu os homens e os organizou em fila, Cícerus, Nathell, seu companheiro Vermunn, a garota e Loil foram postos no meio flanqueados por quatro guerreiros de cada lado. À frente ia o capitão seguido pelo soldado Octávio, atrás deste estava Derek, em seguida um soldado chamado Agamedes, vindo de Housen. Atrás dos cinco estavam Hignar, Nathan, outro soldado: Dante, e então Theodor e seu arco.

                - Vocês devem continuar nessas posições enquanto estivermos caminhando – ordenou o capitão. – Dessa forma estaremos defendendo nossos flancos e os magos e clérigos poderão lançar seus feitiços fora do combate corpo-a-corpo. Em caso de emboscadas, façam um círculo em torno deles, e estejam sempre atentos às minhas ordens.

Os homens ficaram quietos, ninguém contrariou as instruções do capitão. Ele então fez um sinal de aprovação com a cabeça e continuou:

- Sendo assim, vamos cumprir nosso dever. Libertar a ilha, resgatar nossos compatriotas e recuperar nossa liberdade!

- Sim! – Gritaram os homens.

Caminhando pela margem da praia, enfileirados eles seguiram juntos sobre a areia. Circundando uma ponta de árvores que adentrava areia adentro, deixando nada mais do que um metro para eles passarem, alcançaram o outro extremo da praia.

Lá, as árvores faziam um círculo ao redor da água, subindo num pequeno relevo pedregoso onde a areia terminava. Um píer despedaçado, sendo identificado apenas pelas toras de madeira que despontavam da água em duas fileiras eqüidistantes, adentrava o mar uns cinco metros. Conchas e caramujos inabitados jaziam na areia branca formando mosaicos psicodélicos aonde um dia as ondas alcançavam.

- Lá está a entrada da trilha – disse Octávio apontando para uma pequena lacuna entre duas grandes árvores, recobertas com densas folhagens arroxeadas.

O mato crescido cobria todo o arredor da floresta, media quase um metro de altura e se misturava com as trepadeiras que enforcavam os troncos das árvores com seus ramos robustos e pegajosos.

- Fez um ótimo trabalho Octávio – elogiou Victor. – Tivestes um ótimo treino em florestas, mas ainda assim, não é qualquer um que encontra uma trilha nessas condições. Vamos continuar. Peguem suas facas e espadas. Cícerus. Esteja pronto a qualquer momento.

Os homens voltaram a andar. Victor, com sua falcione na mão esquerda, pegou uma faca com a lâmina do tamanho de um antebraço e começou a ceifar o matagal que lhe arranhava os joelhos e as canelas. Os homens atrás fizeram o mesmo. Vez ou outra, Cícerus poupava-lhes o trabalho lançando uma lufada de vento que cortava o mato em milhares de pedacinhos que voavam loucamente na direção oposta.

Em silêncio, e sempre atentos a fila seguiu em frente abrindo caminho pelo mato alto. Vez ou outra eles paravam para aguardar enquanto Cícerus reacendia seu cetro. Seu rosto contorcia-se constantemente em expressões de desagrado, quando algum inseto caía em sua roupa ou quando algum mosquito lhe picava por sob a roupa.

Os insetos pareciam ser as únicas criaturas errantes a não deixarem a maldita ilha. Se eu pudesse já o teria feito, pensava Theodor. O ruído dos grilos, o zunir das cigarras, e até mesmo o chiado das abelhas, além do estalo das asas de diversas outras criaturas minúsculas compunham a orquestra da floresta.

Cada vez mais escura a floresta seguia até seu âmago. A trilha sinuosa parecia se alongar infinitamente fazendo círculos, pois a paisagem, composta por grandes árvores, teias de aranha e trepadeiras e arbustos de grandes e grossas folhas, nunca se alterava.



- “... Cinco cane-cos-de cerveja, quatro gar-rafas de-rum... três cá-lices de-vinho e agora não tenho nenhum...” – Hignar agora cantava em voz baixa.

Já há quase duas horas caminhavam sem verem nada de diferente pelo caminho. O medo e a incerteza foram dando lugar ao tédio. Os homens agora conversavam entre si, sempre em tons baixos. Os únicos quietos eram o próprio Victor, concentrado em cortar o mato por onde passavam, e Cícerus, estressado e cansado demais para falar. Loil conversava com a garota, para Theodor que de vez em quando os observava, parecia mais um monólogo, no qual Loil não parava de falar com sua voz esganiçada, e Lavínia vez ou outra concordava ou negava com a cabeça.

O mato tinha sido substituído por arbustos de folhas serrilhadas que sempre arranhavam as pernas dos distraídos. As tentativas de cortá-los resultaram em grandes jatos de uma gosma verde e grudenta, com isso eles passaram a caminhar por entre elas esquivando-se de suas folhas e de seus espinhos.

- “... Um cane-co-de cerveja, garçom me traga mais um!” – continuava Hignar em seu improviso.

- É incrível como você consegue cantar nessa situação caro Hignar – comentou Nathan educadamente.

Dando uma gargalhada grave Hignar respondeu a ele:

- Se eu não cantasse, eu ficaria pensando em coisas desagradáveis. Além disso, é útil para animar o ambiente. Mas se bem que agora a ilha já não parece mais tão tenebrosa.

- Certo... – concordou, com um sorriso encantador. – Continue então, e deixe-me ver se consigo te acompanhar.

Enquanto ambos cantavam Theodor observou ao redor, passando os olhos pelas sombras além das árvores. Até que sentiu novamente a sensação de cegueira, seguida do silêncio instantâneo de todas as vozes, e o bufar de Cícerus.

- Perdão – disse ele agressivamente.

- Não tem problema nenhum – disse Victor acalmando-o enquanto o mago conjurava novamente sua magia de luz. – Se não fosse pela sua luz mágica não conseguiríamos sequer nos mover.

A luz piscou duas vezes, Theodor sentiu algo batendo em sua cabeça, estalando as asas e voltando a se distanciar, dando um guincho que assustou a todos. E então Cícerus ergueu novamente o cetro iluminado lançando luz em todas as direções.

- Você está bem? – perguntou Dante, o soldado em sua frente.

- Sim, obrigado – respondeu.

Voltaram a caminhar. Theodor ficou a mirar floresta adentro tentando enxergar qualquer irregularidade, como lhe tinha sido ordenado, mas não via nada além de troncos grossos e arbustos espinhosos.

- Finalmente – gritou Octávio, lá na frente da fila.

Derek suspirou aliviado.

Theodor esticou o pescoço para o lado para ver. À frente, uma clareira de uns doze metros se abria em meio às árvores, um círculo quase perfeito coberto com terra, algumas gramíneas e raízes das árvores circunvizinhas.

- Vamos descansar – disse Victor.

Os homens comemoraram e se congratularam entre si, dando-se tapinhas nas costas.

- Vamos – chamou Dante.

Theodor balançou a cabeça e o seguiu. Deixando a mochila no chão recostou-se em uma árvore como fizeram a maioria dos homens. Vermunn ajoelhou-se perto de Agamedes, este suava, e estava absurdamente pálido. Desamarrando o odre de couro de seu cinto bebericou a água jogando a cabeça para trás.

- O que você está sentindo? – perguntava o clérigo.

Em meio a espasmos Agamedes dizia que estava bem. Indo até eles, Nathan ajoelhou-se entre ele e Theodor impedindo que este pudesse ver o desenrolar da conversa.

Theodor viu quando Vermunn ajudou o homem a se deitar e chamou Nathell com um aceno. Indo até lá, Nathell examinou o homem, pondo os dedos sob o maxilar de Agamedes, ouvindo seu coração, e então observou as canelas do soldado, que fervilhavam de bolinhas vermelhas e pequenas bolhas de água em formação. Involuntariamente Theodor observou as próprias pernas, mas havia apenas alguns arranhões.

Victor caminhou, embainhando sua espada, até eles.

- O que está havendo Agamedes?

- Eu não sei senhor. – Respondeu o homem ainda deitado, com um leve tremor na voz.

- Não precisa se levantar – disse o capitão quando Agamedes tentou se erguer com os cotovelos. – Deixe que eles cuidem de você.

- Acho que ele está tendo alguma reação aos ferimentos dos arbustos – explicou Nathell. – Talvez eu tenha trazido alguma erva que possa ajudar.

Virando-se para Vermunn disse:

- Trouxeste bandagens?

- Sim – respondeu ele, tirando algumas faixas brancas de pano de sua bolsa.

- Certo, já sei o que fazer, você ficará bem. Será melhor usar calças enquanto estivermos na floresta, seu corpo é fraco contra essas plantas, suas pernas estão empoladas e é possível que você tenha febre e vomite. Vou preparar algo para curar suas chagas.

Levantando-se, Nathan veio até Theodor que o observava. Sentou-se ao seu lado. E nenhum dos dois falou absolutamente nada. A sensação de calma invadira novamente Theodor, como uma enxurrada de bem estar e felicidade. Ele ficou fitando um nó no tronco de uma árvore do outro lado da clareira enquanto Nathell atava ambas as pernas do soldado, que já tinha readquirido um pouco de sua cor normal após uma mistura de ervas e um chá fervido magicamente.

- Agora podemos conversar – disse Nathan baixo o suficiente para que apenas Theodor escutasse.

Olhando por alguns instantes os olhos azuis do companheiro, Theodor desviou o olhar de volta para o nó na árvore, e sem olhá-lo novamente, perguntou:

- Você está ciente de sua interferência nas mentes das pessoas?

- O que quer dizer? – Perguntou Nathan olhando para ele.

- Sempre que se aproxima de mim, e eu sei que também quando se aproxima de qualquer outra pessoa, eu sinto como se todas as tristezas tivessem me deixado, mas eu não as esqueço, apenas as desvio de meus pensamentos conseguindo ignorá-las. Eu queria saber como você faz isso.

Nathan virou-se para encarar o mesmo nó que Theodor encarava. As curvas delineadas na madeira formando espirais infinitas o tragavam para seu interior escuro como olhos inquisitivos. De certa forma o olhar de Theodor se conectava ao de Nathan a partir daquele buraco na madeira, mesmo que não estivessem se encarando diretamente um podia sentir o outro como se já conhecessem um ao outro há tanto tempo quanto o mundo tinha sido criado.

- Eu não posso responder a sua pergunta, pois não sei a resposta. Mas diga-me se isso te incomoda de alguma forma.

- Não sei se poderia dizer que incomoda, mas as mudanças repentinas de humor que isso me causa, me deixa angustiado e nervoso com o fato de ver meus problemas como se não fossem, de fato, problemas.

- Entendo. Perdoe-me por isso, mas é completamente involuntário e incontrolável. Tentarei fazer o possível para inibir esse meu... se pode se chamar assim: dom. Mas não sei mesmo o que é, talvez desde que meus pais morreram as pessoas ao meu redor reajam dessa forma, ou a bênção dos deuses tenham alterado meu Eu.

Theodor ficou confuso. Olhando nos olhos do amigo, que o encarou de volta, expressou seus pensamentos:

- Como assim? Seus pais morreram? Meus pêsames. Mas o que quer dizer com a bênção dos deuses?

- Dessa forma eu te contaria toda a minha história – disse ele com um risinho.

Agamedes se pusera sentado novamente, recostando-se sobre o tronco da árvore. Do outro lado da clareira, sentados sobre um tronco podre, revestido com uma grossa camada de musgo e liquens, Hignar, Derek e Dante conversavam enquanto comiam alguma coisa que tinham trazido. Andando pelos limites das árvores Lavínia observava o interior da floresta com um rosto impassível segurando firme sua espada curta. Sentado na outra extremidade, mais distante dos outros, estava Octávio. No centro da clareira conversavam os outros. Quando a voz de Cícerus superou a dos outros e ele se afastou do grupo andando na direção de Agamedes, com um braço erguido paralelamente ao chão:

- As árvores desta floresta emanam um fluxo de energia exótico, com o qual nunca tive contato anteriormente, mas ainda posso distinguir certas propriedades que... – sua voz foi diminuindo, quando tocou o tronco da árvore na qual Agamedes descansava olhando para o mago à sua frente com os olhos arregalados e interrogativos. – Mostre-me sua verdadeira forma! – Gritou, servindo-se da força de sua magia. Sua mão emanou uma tênue luz avermelhada. Porém nada aconteceu.

Os homens ao redor ficaram observando o desenrolar do evento, interromperam suas conversas para pousar seus olhos, e fixarem sua atenção no mago, em sua tentativa ineficaz de desvendar a realidade por trás daquela floresta corrompida.

Antes que pudesse se virar, um ramo com a grossura de sua coxa zuniu, cortando o ar, vindo de trás da árvore, com a velocidade e ferocidade de um chicote atingindo-o no estômago e arremessando-o na direção oposta. Voando, Cícerus colidiu contra o tronco de uma árvore perto de Theodor e Nathan. Eles se levantaram sobressaltados correndo para ajudá-lo. Um estalo alto emanou da madeira de seu cajado, quando este, ao se soltar de sua mão, partiu-se em dois ao chocar-se contra uma rocha grande que jazia ali, coberta de limos aveludados.

- De pé! – Urrou o capitão, para os homens que em sua maioria já o tinham feito.

Agamedes se punha de pé apoiando-se na árvore quando do alto dela saltou uma criatura enorme. Parando no meio da clareira, por pouco não esmagando Victor e os outros.

Parecendo um amontoado rudemente humanóide de folhas secas e ramos podres, a criatura aterrissou no chão pedregoso, fazendo-o tremer sob seu peso colossal. Parecendo não ter uma cabeça seu corpo se estendia em cipós e raízes longas e afiladas onde deveriam estar respectivamente, seus braços e pernas.

Virando-se na direção de Agamedes ela projetou seus grossos cipós para tentar agarrá-lo. Desviando de um deles, encolhendo-se, Agamedes tentou caminhar para frente com suas pernas enfaixadas, mas perdeu o equilíbrio.

- Lutem! – Gritou novamente o capitão, retirando sua falcione da bainha.

Theodor, depois de erguer Cícerus junto com Nathan atirou uma flecha na criatura, que perfurou suas folhas e se perdeu em meio ao emaranhado de galhos e folhas. Os homens se aproximaram armados e tentaram circular a criatura que com seus pés chicoteava seus agressores. Lavínia correu para a retaguarda com sua espada na mão, aguardando a reação do grande arbusto animado. Loil por sua vez pegou uma diferente adaga de dentro de sua capa e de seu cinto retirou um frasquinho, cujo conteúdo vermelho agitava-se conforme o homenzinho se mexia.

Agitando novamente seus cipós, a criatura alcançou a perna esquerda de Agamedes e ergueu-o três metros acima do chão. Gritando desesperado, o soldado se debateu tentando se soltar do aperto da criatura, puxando então sua faca fincou-a no membro que o agarrava.

Hignar e Derek investiram contra o monstro com seu machado e sua espada nas mãos. Defendendo-se do segundo com seu pé difuso em dezenas de raízes, foi atingido pelo outro com seu machado, que após atacar recuou dois passos, esquivando-se do cipó que assobiava em sua direção.

Novamente Theodor atirou sua flecha na criatura, e novamente ela se perdeu em meio às folhas. Cícerus, após observar a criatura, moveu as mãos e os lábios conjurando uma magia:

- “Mísseis Mágicos! – Gritou ele.

Duas esferas luminosas azuis deixaram suas mãos e atingiram velozmente o corpo da criatura, carbonizando algumas folhas e produzindo duas pequenas explosões no interior de seu corpanzil. Nathell, visto que Derek não conseguia se soltar por si só, cedendo e sufocando sob o peso da criatura invocou também uma magia:

- “Oh! Mirohrn, deus da guerra e da força, ceda um pouco de sua força para aquele homem que a necessita. Faça-o forte como um touro!

Derek de repente sentiu-se estranho e seus músculos começaram a inchar. As veias saltaram de sua testa e de seu pescoço enquanto seus braços duplicavam de tamanho, e agora ele conseguia afastar pouco a pouco as raízes que lhe prendiam no chão. Libertando-se por fim quando o capitão cortou um pedaço do cipó que passou por sua cabeça arranhando-lhe o braço.

Com um farfalhar agitado a criatura tentou recuar um passo para trás, sendo atingido por Octávio e sua espada. Agamedes que pendia lá em cima gritou novamente quando a criatura segurou-o com o outro tentáculo esmagando-lhe o estômago, apertando-o cada vez mais. O arbusto atacou então com seu braço que antes segurava o tornozelo sangrento de Agamedes. Bloqueando com o escudo de madeira Octávio caiu para trás sob a força do monstro. Seu escudo estalou e partiu-se em dois, balançando o braço ele livrou-se da tábua inútil e pegou sua faca.

Loil, afastando-se um passo para trás, ia atirar o frasco na criatura, mas Vermunn segurou-o:

- Não faça isso! – Advertiu ele segurando o braço do homenzinho sobre sua cabeça. – Mataria nosso companheiro também.

Derek, recolhendo a espada no chão investiu novamente contra o monstro de folhas, fincando-a, com seus músculos avantajados, até se ver apenas o punho dela para fora da criatura. Esta, girando, agitando-se tentou atingir Derek com o cipó livre, mas ele saltou para o lado escavando sulcos no chão e lançando pedras para o alto.

Ela então num acesso de tremeliques, ao ser atingida por mais uma flecha de Theodor e uma estocada de Nathan, que agora se juntava à roda, com seus escudo na mão esquerda, segurou Agamedes com o outro cipó envolvendo dessa vez seu pescoço. O homem tossiu e seu rosto ficou vermelho, e então roxo e tentava gritar, mas tudo que conseguia emitir era um ganido rouco e áspero.

Os homens lá embaixo investiram quase todos juntos com suas espadas e machados numa tentativa desesperada de salvar seu companheiro. A criatura ignorou-os. Esticando seu prisioneiro com a força de dois bois, matou o homem, rasgando sua carne e quebrando seus ossos como se fossem gravetos. Arremessando seu corpo contra Hignar e Victor que estavam mais próximos, sem se importar em acertar, ela se remexeu pisoteando o chão ao redor, tentando atingir qualquer um.

Loil então atirou o frasco nas costas da criatura que ao romper-se libertou o liquido, que em contato com o ar inflamou-se instantaneamente e fixou-se na criatura que girou novamente, agitando-se e balançando sua folhagem decrépita. Atingiu ainda Nathan, derrubando-o no chão, amassando sua armadura que arranhou suas costas e Dante que tentava retirar sua espada das raízes robustas da criatura, o golpe atingiu-lhe transversalmente o tórax, derrubando-o no chão arfando com a força descomunal da criatura.

Em chamas ela contorceu-se. Theodor Atingiu-a novamente e ela tentou andar em sua direção, mas Derek com um giro de sua espada cortou seu pé esquerdo, e ela caiu sem equilíbrio estremecendo o chão. Lavínia saltou para o lado esquivando-se do corpo da criatura que já não se movia mais. As labaredas cresciam e se espalhavam pelo corpo da criatura.

- “Hullryath! – Invocou Nathell. – Manda-me sua água e apaga essa chama

Com suas palavras, sobre o corpo incinerado da criatura formaram-se grandes gotas de água. Vindas do solo, das folhas orvalhadas das árvores, e algumas do próprio ar. Pouco a pouco o fogo transformou-se em fumaça.

Nathan correu até o corpo dilacerado de Agamedes para avaliar se ainda podia fazer alguma coisa. Mas pela sua reação Theodor deduziu que seu companheiro estava morto. Vindo até a criatura deformada Victor aplicou-lhe três golpes onde seria sua cabeça, via-se a nítida expressão de ódio em seus olhos e em suas sobrancelhas que se encontravam no centro de sua fronte em um agudo “V”.

Cícerus recolheu os dois pedaços de seu bastão perto da pedra onde ele se partira e, juntando as duas extremidades da maneira correta pôs seu dedo indicador sobre o encaixe e sussurrou algumas palavras, uma luz verde enfumaçada deixou seu dedo e circulou a madeira fazendo-a voltar à mesma forma de antes, como se nada tivesse acontecido ao cajado que continuava a brilhar. Ergueu-se então jogando os cabelos para trás.

Vermunn depois de verificar com Nathan as condições de Agamedes foi cuidar de Dante que ainda estava caído no chão respirando mal. Retirando-lhe a armadura verificou uma queimadura enorme em seu peito, onde o cipó o havia atingido e então proclamou uma magia de cura simples, pois a fadiga já dominava seus músculos, e se gastasse mais energia acabaria pior do que seu paciente.

Avaliando seus músculos Derek agradeceu à Nathell.

- Não ficarão dessa forma para sempre – respondeu o clérigo. – Olhe – e apontou para Derek de volta.

Seus músculos começaram a encolher, e voltar ao tamanho normal novamente, mesmo que daquela forma ainda fossem duas vezes maiores que os de Theodor. Desapontado Derek olhou para si mesmo avaliando a diferença.

- Bem, - disse ele. – Obrigado por salvar a minha vida de qualquer forma.

- Não há de que – respondeu. – Mas é uma pena que não pude fazer o mesmo com o nosso outro companheiro.

Ele se calou quando Victor passou, embainhando a espada e enxugando o suor na testa com as costas da mão esquerda. Pegando suas coisas no chão, olhou para os outros e disse, enquanto caminhava em direção de volta a trilha:

- Vamos seus molengas. Vamos voltar a andar!

Theodor notou a infelicidade em sua voz, mesmo que ele tentasse ocultá-la com as sombras da moral, que o tinha deixado.



Seguindo pela continuação da trilha, agora mais larga, porém ainda mais selvagem, os homens voltaram a caminhar em fila, Hignar trocara de lugar com Derek, porordem do capitão. Todos estavam em silêncio, e o som se rompia apenas quando algum deles apontava um vulto dentro da floresta, ou protestava com o quanto era longa aquela maldita trilha.

As mãos de Theodor estavam suadas e seguravam o arco com firmeza, prendendo uma flecha sobre a corda retesada, que por sua vez puxava as extremidades do corpo da arma arqueando a madeira. Ele caminhava quieto, pensando em como tudo isso acabaria. Já se foi um. Quantos mais irão antes de conseguirmos deixar essa ilha? Se é que vamos mesmo conseguir deixar essa ilha. Maldição.

O mato se enroscava nas pernas dos homens que se assustavam, olhando para baixo com medo de serem puxados para o meio da floresta e engolidos pela escuridão, que nas histórias infantis sempre guardou tantos mistérios e perigos. Aqueles que diziam não temer o escuro acabaram mudando de opinião.

Conforme iam adentrando a floresta os barulhos iam se intensificando, zumbidos, estalos, cânticos histéricos de cigarras e grilos, que por algum motivo permaneceram na ilha. Chegaram inclusive a passar por o que julgavam ser uma rocha de tão grande, mas Cícerus afirmou veementemente que era um enorme formigueiro, media mais de um metro e meio de altura. As árvores aí eram muito maiores do que as mais próximas da praia, e cresciam repletas de musgos coloridos e cipós. Suas copas se perdiam no céu sem estrelas e suas folhas se entrelaçavam num grande emaranhado que conectava todas as árvores da ilha.

Mais de três horas haviam se passado. O braço de Victor tremia de fadiga, mas ele persistia em seguir abrindo caminho. Os homens não estavam cansados, pois era costume marchar durante dias a fio, com armaduras e equipamentos, parando apenas à noite para descansar. Mas eles não conseguiam definir, sob a sombra da nuvem negra, quando era dia e quando não. A única marcação de tempo era a quantidade de vezes que o cetro de Cícerus acendia e se apagava. O que marcava um intervalo de mais ou menos uma hora.

Foi após ter se apagado uma quarta vez, o cetro, que os homens avistaram alguma variação na trilha. Perpendicularmente à ela abria-se outra, cortando a ilha em duas porções. Esta nova trilha estava completamente desobstruída, sem galhos, mato ou arbustos espinhosos. Porém pior do que tudo isso, foi ter de decidir a grande questão: Para que lado?

E foi isso o que o capitão perguntou, virando-se para Loil, que coçava o queixo com um olhar interrogativo.

- Não sei, não sei... – começou ele. – Poderíamos seguir para qualquer um dos lados e mesmo assim não... Bem, se nosso objetivo é descobrir o que está havendo com a ilha deveríamos ir ao centro dela, ou seja, à mina. Pois se fosse eu o vilão, procuraria por um palácio, ou um lugar para me instalar. E o único lugar assim nessa porção de terra selvagem é aquela montanha.

“Porém... Havia um vilarejo aqui, e este provavelmente ficava perto da mina, pois se eu fosse um minerador, numa ilha selvagem, não iria me expor morando longe dela, seria completamente insensato. Portanto, muito provavelmente o vilarejo fica próximo à mina – ele pareceu ter acabado e o capitão ia começar a falar quando ele continuou. – Porém, não há nenhuma fonte de água potável como um rio. Afinal estamos no meio do mar. Entretanto, o leste da ilha é banhado com a água do Hullryath e certamente...”

- Adiante-se – disse Cícerus impaciente.

- Mago, deixe que eu diga o quanto eu quiser...

- Aí vamos nós – disse Derek.

- Silêncio os dois – disse o capitão quando começaram os xingamentos. – Cícerus, por favor, tenha paciência. Deixe-o terminar.

- Isso mesmo – disse Loil.

- E você, lembra-se do que conversamos? – Disse Victor fuzilando-o com os olhos astutos e cansados.

Loil pôs a língua para fora, e olhou-a ficando vesgo. Depois a recolheu e continuou:

- Certo então. Não é necessária nenhuma briga é claro, e nem nenhuma língua fora de seu devido lugar.

Theodor não pôde conter um risinho. O capitão fitou-o rapidamente, silenciando-o, e repôs os olhos nos de Loil.

- Sendo assim, como eu ia dizendo: O lado leste da ilha é banhado pelo Rio Hullryath e certamente dispõe de água doce, portanto... – ele refletiu alguns segundos. Cícerus bufou, Theodor teve certeza de ver um sorrisinho de meia boca no homenzinho, e só então este prosseguiu. – Portanto, é lá que deve estar o antigo vilarejo da ilha.

- E com isso? – Perguntou um Octávio.

- E com isso, meu caro, é para lá que deveremos seguir, descobrir o que há no vilarejo, talvez encontrar pistas do que controla a ilha, além daquelas pestes aquáticas...

- O que o faz pensar que não são os sahuagins que controlam a ilha? – Perguntou Nathell educadamente.

- Bem, tivemos uma demonstração clara da forma de combate daqueles bichos, e pudemos confirmar nós mesmos de que eles não teriam conseguido matar todos os duzentos homens que vieram para cá apenas naufragando seus navios. Certamente há algo além de sahuagins nessa ilha.

- Quanto aos duzentos homens – disse Nathan.

- O quê?

- Bem, se eles tivessem então chegado à praia, como nós fizemos, ou eles estariam ali, ou teriam se embrenhado na floresta, como nós fizemos, e dessa forma eles certamente teriam deixado vestígios de sua passagem por aqui...

- Eu compreendi aonde queres chegar – disse Cícerus aumentando o tom de voz. – A esta pergunta eu tenho a resposta. E julgo que seja a correta. Como eu disse, essas plantas, os animais, e até mesmo o solo desta ilha está impregnado com uma magia exótica, que não pertence a nenhuma das escolas de magia que eu estudei. E para atingir toda esta extensão com tanta magia seriam necessários muitos magos do meu nível de habilidade.

- Ou apenas um único, com dez vezes mais poder que você – apontou Loil. Talvez ironicamente.

- Sim, ou apenas um poderosíssimo mago – retrucou Cícerus. – Mas para responder a sua pergunta eu diria que o ser mágico que está sob o controle da ilha têm feito um ótimo trabalho para fazê-la parecer abandonada, e estranhamente possuída.

Os homens observavam a conversa sem interferir, o mesmo fazia o capitão.

- Ainda não compreendi – disse Nathan.

- Ele quis dizer – disse Theodor avançando um passo em direção ao círculo que havia se formado na ligação entre as duas trilhas. – que seja lá o que for, tem alguma coisa modificando a ilha constantemente, fazendo por exemplo com que a trilha que seguimos até aqui ficasse escondida. Estou certo – perguntou ele olhando para o mago.

- Sim – disse ele.

- E o que me dizem sobre aquele arbusto gigantesco? – perguntou a garota. Do meio das sombras das árvores ela se juntou à roda também, Theodor recuou assustado. Havia se esquecido de que ela estava ali.

- Ótima pergunta – disse Hignar.

- Aquela era certamente uma animalização de um arbusto comum, provavelmente um efeito da magia da ilha. Se notar bem, todas as plantas que nos cercam foram de alguma forma, alteradas. Nem que seja apenas a coloração de suas folhas – explicou Loil.

- Ou talvez tenha sido um alvo direto da magia – Completou Cícerus. – Talvez tenha sido intencional, por parte do conjurador, dar vida ao arbusto e fazer dele uma arma mortífera.

- E talvez – disse o capitão. – haja mais um dele à solta pela ilha, portanto se vamos para o vilarejo precisamos saber a direção a seguir, e nos apressarmos.