Teorizando
sobre (des)funções humanas na contemporaneidade: Schneider sai de férias!
Quando tratamos do séc. XXI da
perspectiva do ocidente, assistimos (em ambos os sentidos; à saber: ver e
apoiar) diversos discursos acerca do homem contemporâneo. Neste texto quero
focar em um deles: a desumanização
ascendente e contínua do indivíduo. Assim, sigo: a. apontando as
características dessa perda de humanidade; b. questionando sobre o que
entendemos como humanidade; c. fazendo uma análise da palavra raiz no contexto
contemporâneo; d. propondo uma nova humanidade contemporânea sustentável. Acho
por bem que os quatro objetivos, por conta de sua extensão e consistência
teórica, só poderão ser entendidos na forma de uma historietas então, divirta-se!
***
Em dezembro de 1993, Schneider tinha
vinte anos completos. Fizera aniversário a pouco e decidiu comemorar dando-se uma
viagem – desnecessário dizer pra onde. Pensava nesta viagem há muito tempo mas,
nunca teve condições de realizá-la antes, por conta de sua condição financeira.
Ele é filho de servidores públicos, mas seus pais investiram pesado em educação
– algo caríssimo à época – e, por isso, nunca teve muitos luxos. Sabia
consideravelmente de muitas coisas e sua especialidade em conversas e/ou discussões
eram os assuntos relacionados ao Japão e sua cultura pop. Mantinha debates
gostosos com amigos sobre os signos e mensagens (à lá semiótica) das animações,
comumente chamadas de anime. Sabia também tocar piano, sua paixão infantil, na
qual gastou anos e anos de estudo e dedicação.
Enfim, era um pequeno notável e
decidiu se recompensar – recompensar é a palavra exata pois ele havia passado
em provas de ingresso aos cursos universitários de várias faculdades em função
de sua disciplina de estudos (estamos falando da ordem acordar/estudar/ almoçar/estudar/dormir/
em todos os dias da semana, exceto domingo quando se entendia com suas práticas
religiosas). Almejava a carreira de professor, uma profissão para ele nobre e
honrosa.
Era o dia dez de janeiro quando finalizou os
trâmites burocráticos de seu périplo (compra de passagem, emissão de
passaporte, preenchimento de protocolos na embaixada) e começou a pensar sobre
o que iria levar na mala. Começou com um livro, cinco pares de tênis, cinco
calças, cinco blusas estampadas e vermelhas, nécessaire de artigos de higiene
pessoal, meias e cuecas de sobra, sua câmera recém adquirida para o percurso, e
um aparelho com diversas músicas clássicas para escutar em momentos propícios.
Tudo isso numa mala larga e ao mesmo tempo prática – ele sabia arrumar as malas
como ninguém, de modo que fez caber tudo sem muita dificuldade. Com isso, o
tempo passou e o dia chegou: a hora da partida.
Em janeiro de 1994, Schneider se
dirigiu para uma viagem atípica. Sua viagem era mais um símbolo daquilo que
estaria prestes a fazer. A expressão ‘Schneider saiu me viagem’ não era a mais
adequada ali naquele momento; o certo seria dizer que ele estava saindo em peregrinação. Chegou ao aeroporto
sozinho. Seus pais queriam acompanhá-lo para aquele adeus tradicional dos
familiares em aeroportos, mas ele insistiu que precisava fazer isso sozinho. A
viagem seria pra ele uma libertação dos fatos reais.
Pessoas se matam uma vida
inteira para conseguir superar outros que nem conhecem; são inseridas numa
lógica seletiva absurda e imoral; são postas a provas de verificação que
atestam, por meio de uma simbologia inadequada, absolutamente, merda nenhuma se
não que um ou outro pode ser melhor por números diferentes. À esses fatores
devemos pensar Schneider: um menino inserido numa dinâmica externa de
rendimento e produção. Não à toa, ele decidiu viajar; precisava se repensar. Viu-se cercado do vai e vem do
saguão. Um lugar sombrio e curioso: como é possível ter em sua volta um sem
número de pessoas, de carne e osso, mas formalmente mecanizadas, processo
contínuo e aceito contemporaneamente, e sentir-se sozinho? Onde estamos que nossas relações tornam-nos próximos de distantes e
distantes de próximos? Era o que Schneider almejava descobrir em sua
viagem.
Sacou um caderno de notas e rabiscou, como que para afirmar a memória
em tempos futuros, as seguintes palavras que lhe surgiram em pensamento de
repente: Invertemos a ordem dos fatos!
Raízes sustentam folhas e não folhas oprimem raízes. Guardou o caderno e
seguiu para o portão de seu avião, nesse ínterim pensava em como tudo aquilo
lhe parecia uma dança, de movimentos duros e ritmo inumano, do qual, em
peregrinação, tentaria fugir ou abstrair.
***
Autor: Mateus Nascimento
Texto extremamente profundo e provocador. Cada frase precisa ser digerida com cautela. O debate que este texto promove é verdadeiramente encantador. Vou, por bem, pô-lo na aba de educação, que acho que é onde melhor se encaixa, de modo geral, já que boa parte do seu debate, a envolve de maneira absoluta. (Uma pequena nota de Estevão Balado)