Sugestões, Pedidos e Dúvidas

Bem, espero que todos sintam-se livres para requisitar trabalhos específicos, sugerir procedimentos de postagem, fazer algum pedido ou tirar qualquer dúvida.

Agradeço pelas visualizações, mas agradecerei ainda mais pela participação no trabalho! Sintam-se livres para comentar e participar da construção das obras que serão para todos nós!

Se não quiserem fazer isso diretamente aqui, em alguns dos posts, há ainda a página no facebook



13 de novembro de 2013

(Ideias para uma Animação) A Saga de Mormek - Possível Primeiro Episódio

Capítulo 1

A Partida

Numa era onde tudo parecia ser belo, mágico e grandioso nas terras de Baelon o cometa J’tahr Neleth Bjork Kalahdelohr cortou mais uma vez os céus com sua cauda rubra trazendo nela a profecia da guerra que findaria aquela era e daria início a uma nova. As raças se prepararam mais uma vez. Conselhos de sábios e reis se reuniram, as antigas ordens foram restauradas, armas reforjadas. A guerra era iminente.

De um canto a outro do continente, exércitos se mobilizavam e preparavam suas antigas fortalezas para a Grande Guerra que decidiria qual a Rei seria o Senhor Supremo das Terras de Baelon. Isso traria à sua casa e à sua raça Honra! Pelo menos era isso que era dito pelos Anciãos sempre que o cometa surgia novamente a cortar a imensidão azul que era o céu.

Os Elfos faziam seus preparativos nas imensas florestas de Lilith. Preparavam suas flechas e espadas afiadíssimas de Ferro da Lua, como chamavam o metal mágico que usavam em suas forjas. Preparavam suas armaduras de Mithral, o metal mais leve e resistente de Baelon e convocavam novamente a ordem dos Irmãos da Floresta para comandar seu exército.

Os Homens, que tinham tido Gondar de Termotéia como último Senhor Supremo de Baelon na ordem de sucessão, guarneciam suas imensas fortalezas de pedra crua e cinzenta com milhares de guerreiros e armas. Reorganizavam e treinavam novos jovens para montar as bestas aladas que davam nome à Ordem dos Cavaleiros de Dragão.

Os anões reabriam os antigos túneis subterrâneos que ligavam as montanhas de Rorkrentekir, a capital de sua nação com o restante de suas fortalezas e cidades subterrâneas e reuniam-se em seus demorados conselhos políticos para nomear os representantes de cada Clã, para que estes, juntos, pudessem guiar seu povo para a guerra com os mais bem trabalhados equipamentos.

Os clãs dos anões eram muito focados em seus desígnios, e cada facção dessa enorme diminuta raça era responsabilizada, nos momentos das guerras, por alguma parte da produção. O Clã da Folha era o clã dos plantadores e agricultores, o da Pedra o dos pedreiros e engenheiros, o do Aço dos ferreiros, o do Sangue dos guerreiros, o do Ouro dos mercadores, e assim por diante. E todos os anões acreditavam que isso era um desígnio de seu antigo Deus Temyr.

Na verdade, quase todos…

- Mormek! Você não pode sair de casa para se tornar um cavaleiro! – A mãe dele gritava do lado da lareira, agitando a colher de pau enquanto ele se debruçava sobre um prato de assado.

O pai dele estava do outro lado da mesa, vestido em seu avental de couro remendado imundo de cinzas. Tinha tirado as grossas luvas, estas repousavam ao lado de seu prato. Velas e tochas ajudavam a lareira a iluminar toda a cozinha. A presença do aço refletindo o fogo bruxuleante em quase todos os objetos de lá denunciava automaticamente a proveniência deles do Clã do Aço.

Mas ainda assim, se isso não fosse o suficiente para provar seu lugar no Clã, os quadros dos antepassados homens de seu pai, pendurados perto da porta, deveriam ser. Os quatro mais próximos da dispensa mostravam, cada um, um anão de avental em poses altivas exibindo seus malhos. Uma quinta moldura exibia uma tela rasgada lembrando a vergonha que foi seu tataratataratataravô ao, na era anterior, deixar seu posto de ferreiro chefe para tornar-se músico.

- Mãe – disse ele, contidamente. – Eu vou me tornar um cavaleiro, você verá. E serei o anão mais honrado desse e de qualquer outro clã. Montarei um dragão e lutarei ao lado de nosso rei na Grande Guerra! - Terminou ele, bradando, sacudindo a colher e atirando gotas do caldo no rosto de seu pai.

Ele ouviu-o bufar, e virou-se para encará-lo.

- Dragões são coisas de humanos moleque. – Repreendeu-o o pai, do jeito rouco e calmo que falava sempre, enquanto limpava o rosto com a mão grossa e gorducha. Deixando a coxinha que devorava na beira do prato. – O seu lugar é aqui. Conosco, na forja… Nada vai trazer mais honra a um anão do Clã do Aço do que o próprio Aço. Segurar um malho com força e dar com ele numa barra de ferro incandescente! Isso sim é o que deve fazer...

- Isso mesmo Mork, diga para ele! – Rugiu a mãe em apoio.

- Estou dizendo benzinho... – resmungou o pai. – Agora já me perdi. Enfim... Mormek... se busca por honra, fique aqui, onde é o seu lugar.

- Mas pai! Eu quero ser um cavaleiro! Eu quero lutar com uma espada, não fazer uma!

O pai voltou a morder a coxinha, sem saber como expressar seu desapontamento. A mãe voltou a mexer na panela. Mormek terminou a refeição. Estavam todos em total silêncio, a única coisa que se ouvia era o borbulhar do ensopado fervendo sobre a lareira, ele desceu da cadeira e foi até seu quarto.

Lá recolheu suas coisas, vestiu a cota de malha que ele mesmo tinha feito em algum momento da vida durante seus anos de aprendizado com o pai. Pôs sua mochila repleta de roupas e comidas secas para a viagem nas costas, atou um cantil e um saco de dormir a ela, apanhou a espada pendurada pela bainha num gancho na parede e voltou para a cozinha.

Pronto para partir.

- Mãe, pai... Muito obrigado por tudo, mesmo! Mas eu sinto que este não é o meu lugar, eu vou me tornar um cavaleiro! Vocês verão! O maior de todos!

Sua mãe virou-se, uma lágrima marcava-lhe a maçã do rosto e ia perder-se em sua barba.

- Por favor Mormek – disse ela indo até ele. – Não vá!

Ela prendeu suas mãos nas dela olhando-o nos olhos. Ele sentia-se triste por deixá-los, mas sabia que era o que precisava fazer. O que queria fazer!

- Desculpe mãe... eu vou – Ele soltou suas mãos das dela e dirigiu-se para a porta. Abriu-a, deparando-se com o quadro rasgado.

- Mork, diga alguma coisa! – Suplicou a mãe.

- Não tenho mais nada a dizer – resmungou o pai sem levantar os olhos da mesa. – Vá e lembre-se do velho Bohr...

- Eu não vou ser cantor pai... vou ser um Cavaleiro!

Mormek bateu a porta atrás de si, e atravessou as longas e altas galerias pedregosas da grande cidade de Rorkrentekir, passou pelo estábulo e pegou um bode das montanhas, que o levaria mais depressa até a Estrada dos Homens, de onde seguiria para Olívar, a cidade humana mais próxima.

30 de outubro de 2013

(Ideias para uma Animação) A Saga de Mormek - Construção de Personagem

Nome - Rehlar

Raça - Elfo

Idade - 347

Ocupação - Mago

Descrição Física – 160cm, Loiro, magro.

Habilidades – Pegar a mulher mais bonita do recinto... Sempre.

História – Rehlar, enquanto uma criança elfa foi instruída nas artes da sabedoria, da ponderância, da paciência. Aprendeu as músicas mágicas de seu povo, as palavras antigas e viveu todos os anos necessários para tornar-se adulto. Seu pai era um dos magos mais poderosos de seu povo, que lutou há três eras ao lado do Rei Voleth Gaduhr e ensinou ao seu filho as artes mágicas de sua raça.

Rehlar sempre, desde pequeno, teve uma queda por mulheres bonitas, por algum motivo nunca pôde se concentrar adequadamente quando houvesse uma mulher de aparência respeitável a menos de cem metros dele. Sempre tentava aproximar-se, charmoso como era, exímio galanteador, bom com as palavras, poucas podiam resistir a todo o encanto de Rehlar.

Ele não era tão sábio, nem tão paciente e nem tão ponderado quanto os elfos deviam ser. Além disso era míope, e ficou surdo de um ouvido quando um marido ciumento tentou acertá-lo com um canhão ao vê-lo saindo do quarto de sua mulher...

Rehlar não compreendia o ciúme, acreditava que não deveria haver relacionamentos permanentes, porquê não aproveitar o que o mundo nos pode oferecer? Os anciãos ensinavam coisas como compartilhar, dividir, integrar-se com o restante dos indivíduos e com a natureza... por que não seguir isso com o restante das pessoas do sexo oposto?

Sua vida seguiu por anos alternada entre sexo e estudos, ele preferia dar ênfase ao sexo. Partiu em busca de aventuras, e proteção contra os homens que compartilhavam do tal terrível sentimento que ele repudiava. Depois de já ter compartilhado sua natureza com todas as elfas que conhecia, foi em busca das humanas. Para seu pai ele estava indo desenvolver suas aptidões mágicas, ele julga que o tenha feito. Aprendeu a tirar flores das partes mais inusitadas do corpo de uma mulher. Conseguiu enriquecer tirando moedas do ouvido de um jogador de cartas. Passou a encantar mulheres em menos de 3 segundos, com magias não verbais. Ele conseguia desaparecer de quartos sem ser notado, às vezes até conseguia retornar sem nenhuma complicação. Teleportar-se de um armário a outro, de casa em casa e cama em cama.

Durante suas viagens aprendeu e ensinou muito. Mas causou fins de casamentos, deixou para trás corações partidos, maridos furiosos, mulheres apaixonadas, virgens desvirginadas e reis ensandecidos. Por isso era melhor para a saúde instável dele, que permanecesse mudando de ambiente, mudando de ares e climas.

26 de outubro de 2013

(Ideias para uma Animação) A Saga de Mormek - Construção de Personagem

Nome - Tchunk

Raça - Orc

Idade - 22

Ocupação - Ladrão

Descrição Física – 230cm, careca, peludo

Habilidades: Força descomunal, e uma sutileza desconcertante

História – Os pais de Tchunk eram escravos de uma fortaleza humana no coração de Baelon. Seu pai era cavalariço e sua mãe copeira de um senhor, para eles, terrível, chamado Willem de Calhart. Tinham sido capturados em sua tribo, numa incursão humana em busca de escravos. Ele nasceu dentro dos muros da fortaleza, num estábulo, numa manjedoura. Em todos estes lugares. Bebês orcs demoram a sair, são grandes demais.

Durante a infância Tchunk cresceu revoltado com os guardas que maltratavam sua raça, seus pais, e ele. O punham para quebrar pedras, cavar buracos, carregar tijolos, afiar armas... que escolha ruim fizeram. Os orcs são criaturas grandes, fortes e desastradas. Tchunk tinha todos esses adjetivos maximizados. Logo voltarei a isso.

Quando podia, adentrava as cozinhas e roubava legumes, carne, batatas, grãos. Enfim... comida. Levava para seus pais. No início eles o repreendiam por estar roubando, mas logo passaram a precisar daquela comida, quando Willem reforçava a carga de trabalho e mantinha a papa de cereais que eram entregues em porções ínfimas como refeição única. Quando as cozinhas começaram a ficar muito vigiadas, ou quando estavam fechadas, ele intimidava meninos menores para fazerem alguma de suas tarefas enquanto ele deixava o castelo para conseguir comida, roupas e ferramentas nas cercanias da cidade.

Muitas vezes ele foi perseguido, por cães, guardas, ambos juntos. Mas nunca descobriram quem era, pois usava um manto roubado de um príncipe gordo que fora brincar com os filhos de Willem em um rio, junto dos guardas e alguns escravos que os serviam e os guardavam, e teve de sair enrolado na capa de um dos homens de Willem, já que, provavelmente um guaxinim, tinha roubado suas roupas. Usava também uma máscara negra.

Muito discreto.

Sempre discreto.

Certa vez foi pego, e preso, ficou algumas semanas sem voltar para casa, quase seis meses. Foi maltratado na prisão, mas já era forte o bastante para se defender do restante dos homens de lá. Fez um amigo, um humano, que se mostrou disposto a ajudar, a rir de suas tolices, e ensiná-lo alguns pequenos truques, em troca, o orc ajudou-o a fugir da prisão... e não o vira mais. E talvez aqueles dias que passara sem comida e apanhando tenham sido por conta de seu amigo, mas preferia pensar que os guardas eram uns malditos, bastardos, imundos!

Voltando ao ato de afiar armas no castro de Calhart, Tchunk, já com seus dezessete anos, forte como um homem muito forte, descobriu que sua mãe estava muito machucada por conta da punição de um soldado, e seu pai doente pelo excesso de trabalho e falta de comida. Quando teve uma oportunidade empurrou o soldado que tinha açoitado sua mãe contra uma parede, pronto para ensinar-lhe uma lição, mas este tropeçou numa cadeira e caiu sobre um cavalete de lanças e espadas recém afiadas. Ele não tentou mais se levantar. Nunca mais.

Tchunk ficou desesperado, escondeu o corpo da melhor forma possível e correu até seus pais para contar o que havia acontecido. Sabiam que se permanecesse ali, mais cedo ou mais tarde, descobririam. Os três fugiram à noite. Seu pai roubou um cavalo para sua mãe ir sobre ele, ferida como estava. Tchunk roubou uma maça e escondeu-a. Já quase fora da cidade dois guardas tentaram impedi-los de sair. Tchunk esmagou os crânios dos dois juntos, com as mãos, os pôs sentados, recostando-os numa árvore, e partiu com seus pais floresta e noite adentro.

Sabiam que seu antigo vilarejo não existia mais. Passaram algum tempo caçando e vivendo na floresta, mas os conhecimentos precários de medicina foram insuficientes para curar a gangrena que começou a se alastrar pelas costas açoitadas da mãe de Tchunk. Seu pai ficara sem comer bem durante o tempo que estivera preso e por isso estava desnutrido e fraco. Sua mãe não resistiu às dores e faleceu duas semanas depois de caminhada e acampamento na floresta, seu pai, alguns dias depois de sua mãe partir começou a ter febre altíssima e não resistiu. Disse para Tchunk continuar sua vida, encontrar algum lugar para viver...

Tchunk estava bravo. Ele não entendia como seus pais tinham o deixado. Também estava faminto, conhecia pouquíssimo da vida na floresta, precisava encontrar uma cidade. Num vilarejo conseguiu algumas roupas inteiras, pão duro e leite. E na estrada encontrou um meio de sobreviver. Alguns bandidos tinham-no parado para assaltá-lo, mas se frustraram ao ver do que se tratava: um orc maltrapilho. Tchunk segurou a maça até suas juntas ficarem pálidas, e olhou para os bandidos com olhos fundos e ameaçadores. Passou a fazer parte deles. Engordou, aprendeu algumas manhas de bandido, e conseguiu fugir quando derrubou uma pilha de troncos para lenha sobre os soldados que corriam atrás dele enquanto outros levavam presos seus companheiros.

Seguindo viagem, chegou até uma cidadezinha, com o dinheiro que tinha levado dos bandidos quando eles foram presos. Comprou um casebre e comia sempre na taverna... seu dinheiro foi acabando... precisava de mais. E só existe uma coisa que ele faz, além de ser absurdamente forte: roubar.

23 de outubro de 2013

(Ideias para uma Animação) A Saga de Mormek - Construção de Personagem

Geroge Haltón de Manterrión, O Bardo
 
Raça - Humano
 
Idade - 19
 
Ocupação - Bardo
 
Descrição Física – 180cm, magricela, mudo
 
Habilidades - Belíssima voz, Grande Músico, Bom Orador, Inteligente e Culto, Astuto e Sagaz
 
História – Criado na corte de Manterrión George teve a oportunidade de crescer cercado por músicos e pantomimeiros. Ele era protegido do Senhor Carlos Manterrión, pois foi largado pelos pais na porta do grande castelo Manterrión e a senhora Hélia o tomou para si, já que não conseguia dar a Carlos um herdeiro e o criou como se fosse seu filho. Ela o ensinou a ler e escrever, contou-lhe histórias do mundo, ensinou-lhe canções diversas. Logo descobriram que tinha uma facilidade imensa com instrumentos musicais em geral e sua voz era bela e suave e afinada... Uma voz magnífica! Era o que costumavam dizer.
 
Hélia e ele passavam dias nos jardins brincando, e na grande biblioteca estudando. Ele adorava ler com ela. Contudo ela morreu quando ele tinha dez anos. Durante a adolescência George desenvolveu sua música e suas habilidades teatrais junto aos artistas que passavam sempre por lá, com seus grupos de teatro e suas trupes.
 
Carlos o criou como filho durante quase toda a vida, e tornou-se seu mecenas, pagou-lhe viagens para vários cantos do mundo onde se apresentava e ganhava prêmios, comprou-lhe roupas caras, ensinou-lhe as histórias dos reinos, até a lutar, mas nisso não se mostrou muito apto. Após a morte de Hélia era Carlos que passava a maior parte do tempo com George até arranjar uma nova esposa, Marta da casa de Golão. Ele tinha completado quinze anos quando o filho de Manterrión, Marlos, uma mistura tosca do nome dos pais, foi trazido à luz. E agora que havia um verdadeiro herdeiro não fazia mais sentido ser tratado tão bem quanto era... e tampouco desejara um trono.
 
Ele uniu-se a um grupo de pantomimeiros e voltou a viajar pelas terras com seu bandolim e o restante dos integrantes da trupe. Seu nome passou a ser tão conhecido que sempre que sua trupe parava em uma cidade todos os homens e mulheres, de pescadores e cortesãs aos nobres mais ricos da cidade, paravam para ver seus shows. Ele foi requisitado em diversas apresentações particulares, em castros e jardins, casamentos e partos. Certo dia, contudo, como sempre há de haver um que mude a vida de um homem, em uma apresentação no teatro de Riodourado, cantou uma canção de escárnio referente às rameiras que foram para a cama com Gorbe, filho de Gor, guardião da fortaleza de Petérem, uma canção conhecida nos bares e docas mais sujas de Baelon, e que costumam arrancar boas gargalhadas da platéia. Mas naquele dia, não esperava encontrar o protagonista da canção sentado à sua frente com seus guardas atrás de si.
 
Ele fugiu e o restante da sua trupe partiu sem ele. Deixou aquela cidadezinha para nunca mais voltar. Viajou por cidades menores sem nunca mais dizer uma única palavra para que não o reconhecessem. Em algum momento encontrou um tamborete e passou a apresentar-se numa taverna, buscando a cada novo dia um motivo para deixá-la e aventurar-se pelo mundo novamente, conhecer o que ele ainda não conhece, ou o que Hélia lhe dizia que existia quando era pequeno e ainda não havia visto.

20 de outubro de 2013

(Ideias para uma Animação) A Saga de Mormek - Introdução

Há muito tempo atrás um mal terrível vindo dos céus assolou as Terras de Fogo, onde viviam os homens: as temperaturas se elevaram como nunca antes, a luz do sol avançava arruinando tudo em seu caminho com o fogo. Baelon, um indivíduo valente, conseguiu cruzar os desertos guiando um grande grupo de pessoas até o mar, onde, com um navio, o atravessou e alcançou as terras que viriam a ser chamadas de Terras de Baelon. Onde moravam também elfos e anões, e outras criaturas encantadas ou não. E lá os humanos reconstruíram seus lares.

Isso é o que contam as lendas.

O fato é que já faz tanto tempo que os humanos chegaram até aí,  após centenas de anos passados, e milhares de casas construídas ao sul é que os elfos e anões se deram conta do que ocorria fora de seus reinados. À essa altura nem mesmo os humanos lembravam-se a razão que os levara até aí.

Foi quando as criaturas, que iam sendo pouco a pouco expulsas de suas terras pelos humanos, começaram a buscar novos lares nas terras élficas e anãs que eles se deram conta de que algo estava muito errado. Nesta época o cometa rasgou os céus, e nesta época começou a guerra. E a verdade é que o nome do primeiro a atirar uma flecha contra um anão, pondo a culpa num elfo, era Baelon, o Senhor, que guiou os humanos para a batalha mais sangrenta e duradoura de todos os tempos: A Primeira Guerra.

Um número incontável de vidas, até mesmo para os que sabiam contar à partir de um milhão, foram perdidas: élficas, anãs, humanas... e das outras raças também. E o que restou destes povos recomeçou suas histórias tendo aquele grande acontecimento como marco precursor. E como uma funesta tradição a guerra recomeçava sempre que o cometa surgia novamente no infinito celeste.

Ao longo do tempo estabeleceram-se normas para estas guerras interraciais.Os senhores de cada uma delas negociaram e entraram em um acordo criando o Livro de Regras e Anais de Guerras. Cujo título causou a princípio muitas confusões entre os leigos. E assim sucederam-se períodos de paz e períodos de guerra, onde as raças se preparavam mais uma vez, em busca de glória, poder... e só.

É basicamente por isso que eles buscam.

E ganha a guerra aquele que conseguir ficar por último no alto da torre da Fortaleza Dourada.

Sim, é essa a condição mesmo...

Mesmo, posso continuar? Obrigado.

Ao longo do tempo os reinos dos elfos, humanos e anões acabaram se ramificando, por conta de questões políticas internas, e a Grande Guerra passou a mobilizar cada vez menos pessoas. Embora ainda fosse um grande evento, e porventura todos acabassem sendo atingidos pela atmosfera do conflito, ainda havia vida em meio a guerra.

O interesse passava a ser cada vez mais dos senhores humanos que tinham se dividido em 7 reinos. Os elfos e anões permaneciam reclusos em seus ambientes naturais, envolvendo-se pouco com a guerra, o bastante para manterem seus territórios e fronteiras protegidos. E assim o espaço da guerra envolvia geralmente os 7 reis que disputavam pela honra de governar os 7 reinos, e trazer fama ao seu nome e à sua família.

15 de outubro de 2013

Feliz dia do Professor

Uma homenagem à todos os professores, neste dia que foi dado para que eles sejam lembrados. Mas ao invés de serem lembrados como os educadores que são tem sido lembrados pela classe explorada que se tornaram, uma sub-espécie secundária de menor importância, desprezada, prestadora de favores... Não é isso ser um professor. E por isso para nós hoje é um dia de luta, não de descanso. Luta não só pelo nosso reconhecimento, pois seria uma luta prepotente e infundada, mas pelo direito de todos os cidadãos e até mesmo dos não cidadãos do nosso país de terem esta tão importante etapa da vida respeitada, valorizada, bem estruturada. Os professores não lutam apenas por si, lutam por todos. A mídia tenta fazer-nos parecer vândalos, mas não se dão conta que são eles que estão vandalizando com o descaso que tem concedido à educação Pública, e a forma com que todos estes problemas resvalam na educação Particular, cujos patrocinadores se julgam isentos de responsabilidade.

A função do ser humano é refletir e discutir. Abro este espaço então para que o façamos.

A história durante um bom tempo foi o estudo de Grandes Homens, Heróis de seus tempos, para que outros pudessem aprender com seus Grandes Feitos. Mas esse história era insuficiente para compreender o presente, insuficiente para compreender o próprio passado, e insuficiente para compreender as sendas por onde a humanidade passou.
Por isso a História passou a ser a História dos Homens, grandes e pequenos, mas o que são os homens pequenos? Os pobres? Os fracos? Os incapazes? Não, os homens pequenos são todos aqueles que um dia ficaram à sombra dos chamados Homens Grandes, os 'heróis' políticos, os 'grandes' líderes, os astutos generais...
Mas ainda não foi o bastante para abranger tudo e todos... E agora fazemos a História das Gentes, de todas as gentes, sem distinção, não há mais as grandes e as pequenas, as fortes e as fracas...
Há gentes e gentes, cada uma com suas peculiaridades, cada uma com suas falhas e suas capacidades.
Há gentes de todos os tipos, e cada uma delas deve ser contemplada pela disciplina que se diz Humana, por que ser Humano é isso, é compreender, é questionar, é pensar e repensar, é lutar, é mostrar que se tem poder e é acreditar, principalmente, que você faz parte desta história e que a possibilidade de mudá-la está em você, e faz parte de você.
Assim como tem feito parte de todos os Homens da História.
Viva a História.

28 de setembro de 2013

Conto Online - Ímpios Fortalários (Parte 1)



O mundo permanecia negro num matiz profundo e opressor. Os astros tinham sido dragados pelas trevas e a chuva caía intermitentemente, ameaçando parar, entretanto uma nova trovoada explodia em luz brilhante e ofuscante, e logo o céu desabava outra vez.

De encontro ao mar as grossas gotas de chuva estouravam na massa d'água que se jogava contra o paredão rochoso na base da irregular montanha que se erguia como um monstro, uma enorme serpente escamosa saída das profundezas do oceano tão ameaçadora que, brilhando com as luzes dos trovões, parecia mover-se e retorcer-se celebrando o caos.

No topo da montanha estava a fortaleza de Ark'höps, açoitada pelo vento uivante e pela tempestade já habitual. Suas enormes torres inteiramente fechadas abrigavam algo muito pior do que um tempestuoso dia, abrigavam os imortais demônios, exilados e acorrentados magicamente pelos ancestrais conhecimentos descendentes de Ohmân, o Imaculado.

O universo interior e exterior da fortaleza se confundiam por conta da interferência que um possuía sobre o outro. Há anos Ohmân construiu a fortaleza com seus doze discípulos e encarregou as forças naturalmente bravias que cercavam a imponente montanha escarpada de gerar a energia necessária para manter resiliente a prisão que havia criado para os impenitentes demônios, que por sua vez agitavam todo o cosmos circundante deixando-o ainda mais conturbado, por conta de sua natureza de caos descomedida.

A única entrada e saída da fortaleza poderia ser encontrada no topo da montanha no pátio central, cercada por 8 muralhas, uma mais alta que a outra, sendo a do centro a maior de todas, atingindo metade da altura das doze torres que possuíam trinta metros. Cada uma variando de quinze a vinte e cinco metros de espessura de pedra e metal. 

As dependências da fortaleza eram construídas em níveis subterrâneos, sendo o mais baixo o que abrigava as criaturas mais infames e perniciosas. E era lá que ele estava. As costas curvadas, enrijecidas pelo tempo que foi forçado a manter a mesma posição de cruz, visto que seus braços, agrilhoados por pesadas correntes eram mantidos, imóveis, esticados para as laterais de seu robusto corpo. Suas pernas estavam livres, mas não era possível movê-las por conta da energia que tinha sido consumida dele.

Sentia frio, mas não conseguia tremer, fome mas não lhe traziam comida, cansaço mas não dormia. Sua cabeça abaixada deixava seus grossos cabelos negros cascatearem pela lateral do rosto ossudo e pelos ombros, exibindo os espinhos que despontavam de cada uma de suas vértebras e os oito chifres curvos que se retorciam do lado externo de seu crânio, como uma coroa córnea. Sua pele vermelho-escuro exibia as fibras musculares tensionadas e inflexíveis refletindo a parca luz alaranjada que era emitida de orbes flutuantes sobre arandelas.

Não havia uma cela, propriamente dita, pois não era necessária. Ele estava detido numa ampla sala sob o centro de um teto abobadado em cruzaria cujo acesso era possível apenas magicamente, ou abrindo-se um buraco em alguma das paredes que ele sabia possuírem, em qualquer direção, ao menos duzentos metros de espessura de rocha sólida, para se chegar a uma queda de não menos do que quinhentos metros. E por isso estava ali, absorto, observando um ponto fixo próximo do seu casco direito do enorme mosaico que preenchia o chão, onde um azulejo minúsculo estava faltando.

Nada mais do que uma vibração, um zumbido permanente, parecia perturbar a atmosfera da quieta e imutável sala. Por uma eternidade isso foi tudo o que ele conseguiu sentir. E esse zumbido o irritava. O mundo o irritava, os homens, a existência a própria vida e até a morte o irritavam. Talvez agora não precisasse mais se sentir irritado. Mas o maldito zumbido não permitia que ele se esquecesse que ainda estava ali, que ainda estava vivo, e criaturas como ele permanecem vivas até que a tarefa que os tenha gerado seja concluída.

E por conta da tarefa que ele tem a cumprir os Ímpios Cavaleiros da Ordem Ohmâniana da Fortaleza de Ark'höps o trancafiaram no recôndito de seu domínio, pois tem o dever de atrasar tal acontecimento. 

Mas sabem que nunca poderão impedi-lo.

14 de setembro de 2013

Livro (Em Processo) - Capítulo Cinco d'Os Guardiões de Tarkataz

V
De volta para Orull, e a língua do vento

Theodor havia chegado em casa esbaforido. Andava de um lado para o outro, em silêncio, enrugando a testa e pensando. Tudo aconteceu muito rápido. Há dois dias ele tinha chegado, e agora ele terá de ir novamente. Sobre o que será esse raio de assembléia? Pensava ele furioso enquanto caminhava a passos longos fazendo o assoalho de madeira protestar sob suas botas de couro marrom. E...  sou apenas um soldado, não entendo... Realmente não entendo. Outro problema seriam as conseqüências... o que poderia acontecer se eu não fosse?

- Já voltou? – Era sua mãe. Ela acabara de chegar à cozinha, de camisola.

- Si... sim – respondeu ele assustando-se.

- Que cara é essa? Parece nervoso.

- Pois estou.

- O que houve? – Perguntou ela aproximando-se de seu filho gentilmente.

- Um mensageiro de Orull veio até a cidade. Chegou há pouco. Ele trouxe uma intimação para que eu comparecesse a uma assembléia na capital. Mas eu não sei o que devo fazer...

- O que acha que deve ser feito? – perguntou sua mãe com um tom carinhoso.

- Minha honra quer ir, mas meu coração deseja ficar.

Sua mãe o olhou com afeto e abraçou-o. Logo em seguida batidas fortes na porta fizeram-nos se separarem. Leon, Nillah e Oto irromperam cozinha adentro. Victória e Theodor viraram-se para eles.

- Desculpe-nos senhorita Victória – apressou-se em dizer Nillah. – Pela avançada hora.

- Claro – respondeu ela. – O que desejam crianças?

- Viemos falar com Theo – respondeu Leon.

- Olá – respondeu.

- Meu irmão me disse que partiria de volta para Orull – disse Oto. – Isso é verdade?

- A verdade é que um mensageiro me trouxe uma mensagem, dizendo para que eu voltasse, mas não quero ir. Pelo menos não tão depressa. Queria passar mais um tempo aqui, com vocês, porém talvez isso me cause problemas, a carta era endereçada a mim, com uma ordem expressa do Rei.

Nillah soltou um gritinho de espanto. Os outros dois amigos observaram-no surpresos.

- Devo partir hoje – continuou ele. – O homem me levará junto dele, em sua montaria alada.

- Montaria alada? – Perguntou Leon pasmo.

- Sim, os mensageiros especiais de Orull montam águias gigantes.

- Incrível! Mais um motivo para ir!

- Leon! – Repreendeu-o Nillah – Tudo correrá bem Theo – disse ela meigamente.

- Theodor... – Disse Oto. – Não se preocupe, nós ainda estaremos aqui quando você voltar. Esperando pelo novo general de Orull.

Theodor sorriu agradecido.

- Vamos então! – Disse Victória. – Mecham-se e ajudem seu amigo a preparar as malas!

- Isso mesmo!

- Vamos lá! – disse Theodor.

Uma lágrima de alegria encheu-lhe os olhos enquanto os três amigos o abraçavam. E sua mãe, com os braços cruzados, assistia contente a cena de amizade.

Os quatro juntos foram até o quarto de Theodor. Conversando e rindo. Theodor passou um pano no fio de sua espada, que ainda estava bem afiada, a pôs na bainha nova que comprara no festival. Vestiu sua cota de malha. Pegou seu novo arco desencordoado e o pôs na aljava junto as suas flechas de carvalho. Leon estava arrumando sua cama, Oto juntando algumas roupas enquanto Nillah as dobrava e punha numa mochila de couro que encontrou pendurada num prego enferrujado na parede do quarto.

- Obrigado pela ajuda de vocês – Disse Theodor jogando a mochila por cima dos ombros. – Eu, sem dúvida, jamais encontrarei amigos melhores do que vocês.

- Eu concordo plenamente! – Respondeu Leon vaidosamente.

Os amigos riram.

- Então vamos! Preciso viajar!

Eles então deixaram o quarto e foram até a cozinha, onde estavam na mesa conversando Victória e seu pai, que se levantou ao ver Theodor.

- Pretendia ir embora sem se despedir de mim? – Perguntou seu avô com sua voz rouca e seca. – Talvez quando retorne já não me encontre mais aqui.

- Claro que não vovô, não diga uma coisa dessas novamente! – disse isso, e foi até lá para dar-lhe um abraço apertado.

Beijou o rosto de sua mãe e disse:

- Adeus mãe. Voltarei assim que puder!

- Faça isso meu querido.

Dizendo isso ele abriu a porta, olhou para trás novamente. Acenou para sua mãe e para seu avô, e deixou a casa, sem saber quando a veria novamente. Seguido por Leon, Oto e Nillah, ele olhou para o céu estrelado naquela noite de lua cheia. A brisa suave balançava seus cabelos como uma mão suave a acariciar-lhe as mechas douradas. Os quatro, juntos caminharam silenciosamente em direção a ponte. Passaram pela árvore que naquela manhã estava sendo atacada por Charlie. Victória e o avô de Theodor ficaram a observar-lo da janela de casa, vendo-o se afastar até se perder de vista na rua escura.

Algumas pessoas voltavam agora para casa trazendo os produtos que não foram vendidos de suas lojinhas durante o festival. Algumas tochas permaneciam acesas na praça do mercado. Ao se aproximarem o suficiente da ponte puderam ver o semblante do grande animal alado e seu cavaleiro. A águia, diferentemente de outrora, parecia calma e gentil, agora que estava sossegada, sem uma multidão lhe cercando. Com o bico coçava embaixo de uma das asas. Leon ficou impressionado com o tamanho da criatura que tinha o dobro da altura dele, e com sua beleza exótica.

- Vejo que retornou – disse o mensageiro. – Acredito que tenhas feito a escolha correta.

- Sim. Retornei e estou pronto para partir – respondeu Theodor.

- Ótimo! A propósito me chamo Ivor – E então virando-se para a águia ele disse algumas coisas. Imediatamente a águia parou de se coçar, abaixou a cabeça e o homem pulou para cima de suas costas até parar sobre uma sela de couro acolchoada. – Venha, monte.

Boquiaberto Leon soltou um palavrão, admirado com a cena. Theodor com um aperto no peito despediu-se dos três amigos, abraçou-os demoradamente. Virando-se para o homem sobre a águia perguntou:

- Como subo?

-Dê-me a mão. Pule para o centro de suas costas e então prenda-se com as fivelas de couro da sela.

Ele disse de forma que parecesse simples. Theodor então tentou. Pulou para as costas da ave, como faria para montar um cavalo, mas escorregou em suas penas lisas e foi parar atrás dela. Os amigos riram, e o homem também. Ele ficou vermelho.

- Segure-se firme na sela – disse Ivor estendendo o braço para baixo novamente.

Theodor tentou novamente. Pulou e sentou sobre a sela. O homem o segurou para que não escorregasse novamente. Passou um cinto de couro ao redor da cintura de Theodor e amarrou firme.

- Muito bem. Agora prenda suas pernas ali e ali – disse ele apontando para algumas outras fivelas ao lado do corpo da águia.

Theodor o fez.

- Agora prepare-se. Vamos voar!

Theodor não teve tempo de dizer um último adeus a seus amigos, as palavras foram engolidas junto com uma tragada de ar quando a águia com um comando de Ivor bateu as asas agressivamente e alçou vôo marcando a ponte com suas garras afiadas como adagas. Ele sentiu seu estômago ser comprimido e a pressão apertar seus tímpanos conforme a criatura tomava distância do chão pegando carona em uma rajada de ar quente.

Por um momento tudo que Theodor podia perceber era o bater de asas do animal no qual estava montado. Ele estava tonto e nauseado. Mas pouco tempo se passou até que ele estivesse normal. Foi então que se deu conta de onde estava. Ele olhou para baixo e se viu a vários metros do chão e a cada segundo, maior ficava esta distância. Seus amigos agora não passavam de pontinhos escuros. As fazendas e as casas iam ficando para trás, eram como um mosaico escuro com algumas pedras preciosas incrustadas, que seriam as tochas. O rio Dell que cortava a cidade agora era uma linha prateada que seguia para o sul.

Eles seguiram sobrevoando o rio, que mais ao sul desaguava em outro. O rio chama-se Rio Hullryath, em homenagem ao deus da vida e progenitor de todos os seres que habitam o mundo. É o maior rio conhecido. Ele nasce além das terras desérticas a leste e deságua no mar às margens da muralha norte de Orull. Tem cerca de treze quilômetros de largura e muito mais do que quatro mil de extensão. Além de diversos afluentes.

A noite estava fria, e gotas de água começavam a escorrer pela face de Theodor, logo seus cabelos estavam molhados e suas roupas também. Ivor jogou para ele um cobertor grosso que trazia consigo. Agradecendo mudamente ele se enrolou com o cobertor áspero e adormeceu, exausto com o dia.

~*~*~*~

Theodor despertou assustado e confuso. Olhou ao redor, um bando de pássaros coloridos voava perto dele, gritando e piando assustados para a águia, que ignorava o incômodo. Abaixo deles seguia correndo velozmente Rio Hullryath, margeado pelas últimas Colinas Verdejantes. O sol brilhava forte por detrás deles e queimava a nuca de Theodor, enquanto secava suas roupas molhadas pela garoa da noite anterior.

A águia se deslocava numa velocidade incrível levando em conta o peso que ela carregava em suas costas. De vez em quando ela parava de bater as suas asas enormes e planava graciosamente sobre a floresta que ia gradativamente dando lugar a uma planície extensa.

Theodor então tirou o cobertor de suas costas, foi quando Ivor olhou para trás:

- Ah! Você acordou.

- Sim, bom dia – respondeu ele acanhadamente.

- Tome, coma isso – Ivor pegou algo em sua sacola e entregou a Theodor. – Espero que tenha dormido bem.

Theodor pegou o pequeno embrulho quadrado de pano e o abriu. Dentro havia uma espécie de pão recheado com queijo. Agradecendo a, se é que se pode chamar dessa forma, hospitalidade do homem, começou a comer. Estava delicioso, o pão era macio e muito saboroso, na verdade o recheio não era apenas de queijo. Tempero e alguns pedaços de carne também compunham o interior do pão. Theodor devorou seu desjejum satisfeito.

- Você sabe o motivo de minha intimação? – Perguntou Theodor sem esperar nenhum retorno afirmativo.

- Perdão, mas eu o desconheço – respondeu Ivor. – Mas posso adiantar-te que vários de meus companheiros receberam a mesma tarefa: Buscar algum guerreiro em alguma cidade distante. Inclusive North-Rowüll.

- Onde fica esse lugar?

- Você realmente não sabe?

- Eu sei que é uma cidade fria, e que fica ao norte.

- Então sabes quase tanto quanto eu. Não há muito contato daqueles homens com os nossos. Eles vêm de vez em quando para fazer comércio. Vendem carne, couro curtido, animais, tecidos e algumas outras coisas. São homens bastante exóticos, aficionados por barbas e tranças. Suas mulheres costumam usar tranças em seus cabelos, e os homens... em suas barbas – Ivor disse com um tom de ironia fazendo com que Theodor risse. – Porém são conhecidos pela sua ótima desenvoltura em combate, e seus navios muito bem projetados, que alcançam velocidades surpreendentes, e também são muito bons para combates em alto mar.

- North-Rowüll não faz parte do reino de Orull, faz?

- Ah não, não...

- Pois então o que estariam os guerreiros de Orull, fazendo por lá?

- Não fazia. Até Hector conquistá-la – continuou.

Theodor arregalou os olhos, mas Ivor não percebeu, e continuou:

- Sua última guerra nos prestou o controle sobre as terras geladas do norte, e um grande exército está instalado lá, mantendo o controle sobre a situação.

- O império Orulliano agora estende-se de norte a sul... – murmurou Theodor mirando o horizonte.

~*~*~*~

Eles conversaram durante muito tempo, sobre qualquer assunto que pudesse preencher o tempo de viagem que os separava de seu destino. Theodor olhava ao redor a todo instante, reparava como era extenso o mundo ao redor, jamais pensara em transpor um espaço tão grande em tão pouco tempo, e na altura que estava ele podia ver ainda mais além, o que era no mínimo magnífico.

Poucas horas depois assomaram-se ao Rio Hullryath litros e mais litros de água que desembocavam de um afluente quase tão largo quanto ele próprio. Era o chamado Rio Ki-Kay, este vinha do norte. Ele brotava de uma grande, na verdade de uma enorme montanha no coração das Florestas Azuis. A violência com que as águas se encontravam era tanta que Theodor podia ouvir o chiado que elas emitiam àquela distância.

Muitas horas depois, enquanto o sol lançava manchas rosadas e douradas nas nuvens robustas que pairavam no céu mais ao leste, flutuando, estáticas, como uma pintura emoldurada na parede do infinito. As colinas já tinham ficado muitos quilômetros para trás e agora o que viam era uma extensa planície pontilhada por alguns poucos arbustos e árvores de pequeno porte. 

- Olhe – apontou Ivor para o horizonte, onde uma cadeia montanhosa se erguia para o sudoeste, recortando a paisagem com seus picos agudos. – Aquela é “A Cordilheira Sangrenta”.

- Parece sombrio... – disse Theodor sentindo um leve tremor percorrer a espinha.

- De fato não é um lugar muito explorado, e existem muitas lendas de criaturas misteriosas que habitam aquela região traiçoeira. Aquelas montanhas são repletas de desfiladeiros, cavernas, e costumam sofrer muitos deslizamentos que às vezes derrubam alguns dos túneis das minas de Orull. Mas o nome se dá por causa do vulcão que de tempos em tempos cospe fogo de sua enorme boca.

- Eu me lembro de tê-las visitado durante meu treinamento em Orull, mas não fui muito afundo. Passamos por uma pequena estrada entre as pedras nuas das montanhas para chegar até Housen certa vez.

- Sim. É o único motivo para se passar por lá, chegar até o reino vizinho de Housen, a estrada é usada apenas por mercadores e soldados, contudo, os que têm pressa, pois muitos preferem dar a volta nas montanhas.

Theodor olhava ao redor apreciando o sol que ia se afundando no oceano, ainda fora de seu campo de visão.

- A viagem não é tão longa, e é tranqüila – tranqüilizou-o Ivor – mais duas noites de viagem... e chegaremos ao entardecer do segundo dia.

- Sua ave nunca se cansa? – Perguntou Theodor, de certa forma preocupado.

- Minha ave – disse o homem, com um tom, talvez, agressivo – se chama Ptah. – E repentinamente, adotando um tom muito mais cordial, como antes, continuou. – Claro que se cansa, mas até que isso aconteça estendem-se dias, esses pássaros são proeminentes da Cordilheira Sangrenta, onde não há muito alimento para elas e então são obrigados a passar dias a fio buscando alguma presa de seu agrado.

- Compreendo – ele cogitou desculpar-se pelo possível insulto, mas preferiu deixar pra lá.

A noite furtivamente estendeu seu manto negro sobre as cabeças das três criaturas que voavam em silêncio naquele céu frio. Junto dela veio a lua minguante, com seu rebanho de estrelas que piscavam graciosamente para Theodor. 

- Segure-se – alertou Ivor. – Vamos descer um pouco, para nos proteger do frio.

Theodor certificou-se de que as fivelas em suas pernas estavam bem firmes e deitou-se para trás nas penas macias da ave, contemplando os pontos prateados que eram as estrelas, deixando-se embalar pelo vai e vem das asas lutando contra o que ele não sabia o que... Porque os pássaros voam e nós não?... Um vento frio soprava contra eles, ele se enrolou no cobertor grosso de cânhamo e adormeceu.

- O tempo vai virar – resmungou Ivor, mais pra si do que pra Theodor.

~*~*~*~

O dia seguinte amanheceu frio e nebuloso, uma mudança repentina do clima... Pequenos cristais de gelo se formavam nas gotas de, ou chuva ou orvalho, que se seguravam com força aos cabelos e a barba desgrenhados de Theodor.

Percebeu, ao olhar em volta, que estavam circundando a Cordilheira Sangrenta. A névoa cobria agora os picos das montanhas e uma fina camada revestia o solo abaixo deles, como se fosse algodão recém colhido do pé, branca volumosa e densa, mas que ao toque se mostrava suave e líquida.

O céu estava pálido como um cadáver, e nuvens cinzentas se moviam rapidamente, como ordenava o vento, que as empurrava impiedosamente, como escravas revoltas. Seus cabelos chicoteavam seus olhos e suas orelhas e um som grave reverberava em seus ouvidos como se fosse um trovão tocando uma sinfonia medonha num compasso ritmado... sem parar.

- Bom dia Theodor, hoje nos será um dia difícil, mas ao menos sabemos que será o último – gritava Ivor virando a cabeça para trás – Amanhã chegaremos! Uma tempestade daquelas está se formando, o que não é nada nada bom!

- Não há como nos protegermos da chuva? – Gritou ele de volta.

- Claro que há, e é exatamente isso que eu e Ptah estamos providenciando... – ele olhou para frente rapidamente para verificar o curso e se voltou para Theodor novamente. – Vamos passar por entre as montanhas, as nuvens estão pesadas e as montanhas estão acima delas, estaremos protegidos satisfatoriamente! Mas o frio será terrível!

Passou-se apenas alguns minutos até que Ivor gritasse novamente:

- Segure-se firme!

E então puxou o que seriam as rédeas de Ptah, um solavanco forte arrastou-os para o lado quando a ave fez uma curva brusca para o meio das montanhas. Uma pedra passou raspando pela cabeça de Theodor, que se encolheu assustado. 

O clima lá era diferente, no céu podia-se ver o azul claro que àquela hora da manhã era praxe exibir.

Eles voavam perto dos topos das montanhas, o que gerava certo desconforto por conta da pressão e do ar rarefeito. A paisagem era composta por largos pilares de pedra nua e cinzenta que se afilavam nas pontas. Era como uma das camas de prego que certa vez Theodor assistiu um homem de turbante se deitar sobre. Entre algumas fendas nas pedras brotavam pequenas plantas que davam vida e cor ao ambiente inóspito.

- Aqui estaremos seguros – disse Ivor.

Onde estavam, o único sinal de que do lado de fora caía um temporal era o assovio lamurioso do vento que ecoava nas rochas das montanhas e o chiado inexorável da chuva.

Theodor sentia certa tontura e uma exaustão repentina e inexplicável. Horas se passaram então sem pronunciar uma única palavra. Passaram por eles uma infinidade de montanhas, cavernas e grutas, pedras soltas e algumas poucas árvores, cactos e plantas rasteiras. A fauna à primeira vista era quase nula, mas era possível ouvir-se ao longe, gritos e berros de pássaros em meio à chuva e o pranto do vento.
A respiração descompassada de Theodor acentuava sua forte dor de cabeça. Pegou seu cantil e tomou alguns goles de água.

Voaram por cerca de duas horas até que as montanhas se tornavam maiores e mais espaçadas, possibilitando que eles voassem mais baixo. O que Theodor mais queria! A pressão aliviou seu aperto, e o ar voltou a circular normalmente em suas narinas. Aos poucos a dor de cabeça foi se esvaindo, deixando-o em paz. E ele dava vivas por isso. A tempestade continuava, e aos poucos foi tomando espaço entre as montanhas. Filetes de água escorriam pelas rochas, desaparecendo entre uma montanha e outra.

Tempos depois Theodor pôde ver em uma abertura em forma de “V” uma enorme teia de aranha. Mas não uma simples teia, as cordas tinham a grossura de seu pulso. Se isso for mesmo de uma aranha, seu prato favorito certamente não são insetos, pensou ele. Mas seja lá qual for a criatura que construíra aquela ostentosa obra natural, não estava lá para se apresentar, ele agradeceu por isso.

A paisagem ficava sempre inalterável. O tédio tomou conta de Theodor. Ele tirou o seu novo arco da aljava, o encordoou e ficou admirando a beleza da peça. Passava os dedos por toda a sua extensão, sentindo os entalhes na madeira.

- Belo arco você traz aí – comentou Ivor.

- Ganhei anteontem num jogo durante o festival da minha cidade, num torne...

Theodor parou e tampou os ouvido quando Ptah gritou. Um grito de alerta. Tão alto que algumas rochas despencaram do topo das montanhas e despencaram encosta abaixo, rolando.

- Oh, céus... – suspirou Ivor, apavorado.

- O que foi? – perguntou Theodor alerta, levando a mão instintivamente a uma das flechas em sua cintura.

Com o braço trêmulo Ivor apontou para uma laje a cerca de trinta metros de altura. Lá, voavam cerca de quinze criaturas, que a esta distância não passavam de urubus.

- Gaviões-Gancho... – proferiu Ivor entre dentes, como se fosse um nome proibido... uma maldição.

As criaturas devolveram o grito, em uníssono. O grito se assemelhava mais a um trovão. Os quinze pássaros se reuniram formando uma nuvem negra e mergulharam em investida contra Ptah e seus cavaleiros.

- Gwey! – Gritou Ivor para sua montaria.

A Águia Gigante fechou as asas e mergulhou mais fundo nas montanhas, ganhando velocidade. A luminosidade não era tão boa, pois as montanhas se cobriam e faziam sombras em suas bases. Theodor virou a cabeça para trás e viu um vulto se aproximando deles em alta velocidade. Os Gaviões-Gancho os alcançariam em poucos segundos. Ptah fez uma curva brusca para a esquerda ainda sem abrir as asas, acompanhando a encosta da montanha mais próxima.

Os oponentes estavam já a dez metros. Banhados pelo Sol, Theodor pôde ver como eram assustadoras aquelas criaturas. Elas possuíam corpos sinuosos, semelhantes a serpentes, com pescoços compridos e caudas longas. Um par de asas projetava-se das laterais de seus troncos esqueléticos. A maior parte de seus corpos eram revestidos por uma grossa armadura de escamas negras iridescentes, com tufos de penas alaranjadas em seus pescoços e caudas. Suas cabeças finas terminavam em longos bicos curvos e serrilhados, eram brilhantes como aço, e logo Theodor descobriria se eram também tão letais quanto. Dois pares de olhos malévolos estavam incrustados em suas faces ossudas, um acima e outro abaixo do bico.

Ptah os levava cada vez mais fundo nas montanhas, tentando fugir de seus perseguidores. Mas estes eram incansáveis.

Passando por um arco rochoso Ptah forçou os oponentes a se dividirem. Três continuaram a perseguição, os outros tiveram que dar a volta no pequeno túnel. Já estavam a cinco metros dela. Theodor aproveitou a distância, armou uma flecha em seu arco, puxou-o com força e disparou. A flecha cortou as sombras e fincou-se dentro da boca de uma das criaturas que gritavam, fazendo com que ela perdesse o rumo e batesse contra a parede dando cambalhotas e esfolando a pele contra a rocha áspera.

Por um buraco no teto Theodor pôde ver o restante das aves sobrevoando-os. Ivor guiava Ptah com notável habilidade e os conduzia por entre as pedras, impedindo que se chocassem contra alguma delas.

- Faça-a subir no próximo buraco, vamos deixá-las para trás! – Gritou Theodor.

- Vou tentar! – Foi a resposta.

As duas restantes que os seguiam de perto alcançaram Ptah antes que Theodor pudesse atirar mais uma flecha. Deslizaram para tentar dilacerar suas vísceras, mas Ivor puxou as rédeas para o lado e elas passaram direto por cima deles, por pouco deixando de atingir Theodor nas costelas. Ele então com a flecha que segurava na mão perfurou o flanco de uma das criaturas enquanto ela passava por eles. Ela guinchou arreganhando seu bico torto. Pondo a flecha no arco disparou novamente. Mirou o peito desprotegido do gavião ainda são, atingiu-o em cheio no ventre côncavo perfurando-lhe o estômago. Morto ele caiu batendo no chão e girando sobre si mesmo em ângulos confusos e cores que se alternavam entre laranja e preto, passando por baixo da barriga de Ptah.

Enquanto a criatura remanescente fazia uma manobra dobrando seu corpo num “S” para tentar novamente investir contra seus inimigos, um buraco na lateral do túnel deu-lhes passagem para o céu aberto. Com dificuldade Ptah passou pela abertura pequena demais para suas asas enormes. Emergiram os três das profundezas daquele túnel. Ptah bateu com força suas asas tentando ganhar altitude. Outro daqueles gritos relampejantes encheu o ar quando a ave ferida saiu do túnel serpenteando, cortando o céu atrás de sua presa, enfurecida e ensangüentada, convocando aos berros o restante de seu bando.

Ptah os levava em espiral para o topo da montanha que aos poucos era banhada pelo Sol. Mais abaixo estavam as criaturas – coléricas com a morte de duas de suas companheiras.

- Aves malditas! – Rosnou Theodor tocando a bochecha banhada em sangue devido ao corte em seu supercílio direito. Machucara ao bater com a cabeça no buraco do túnel, mas não havia notado até então.

Theodor disparou mais cinco flechas consecutivas contra as criaturas abaixo dele. Uma das flechas acertou bem no meio da testa de um dos gaviões que despencou morto formando um vórtice, adentrando as trevas que se formavam no sopé das montanhas. Outra acertou na asa de um deles e fincou-se em suas escamas negras que cobriam-lhe o membro. A ave torceu seu pescoço e arrancou a flecha que a molestava quebrando-a como um graveto com seu bico potente. As outras flechas foram desviadas, uma das aves voou em espiral em torno de uma das flechas, para no final chicoteá-la com a calda olhando fixamente dentro dos olhos de seu agressor. Theodor estremeceu com aquele olhar.

- Depressa! – Gritou

- Ptah está dando seu máximo, somos muito pesados! Normalmente ela fugiria fácil...

Theodor olhou ao redor em busca de algo que os pudesse ajudar em sua fuga. E então a imagem da enorme teia que havia visto a tempos atrás perpassou-lhe a mente. 

- Tenho um plano!

- Ótimo – grunhiu Ivor – apenas me diga o que fazer!

O coração de Theodor retumbava agitado. Diversos espasmos percorriam-lhe os músculos. É muito diferente combater outros guerreiros...

- No caminho para cá avistei uma teia gigantesca! Se conseguirmos levá-los até lá poderemos nos safar!

- Aponte a direção!

- Apenas volte o caminho que fizemos até aqui, desde que entramos nas montanhas.

Um gavião tentou morder o rosto de Theodor com seu bico afiadíssimo, mas seus reflexos foram demasiado lentos e acabou por levar uma bordoada entre os olhos com o arco de Theodor, ao mesmo tempo em que este se virava para evitar o golpe. A ave caiu morta. Penas se desprenderam de seu pescoço magro e planaram no ar agitado. Theodor perdera a atenção nas criaturas que agora os tinham alcançado e investiam por todos os lados com suas garras cintilantes e seus bicos oblíquos. Ao tentar se defender de uma das criaturas Theodor teve seu braço esquerdo cortado pelas garras de uma delas, do ombro ao pulso, rapidamente o sangue manchou suas vestes, as de Ivor e também as penas de Ptah. Centelhas vermelhas e laranjas dançaram em frente aos seus olhos, junto a milhares de luzes que piscavam... seu corpo ameaçou desmaiar. Chegou a fechar os olhos...

- Theodor! Não! – Gritou Ivor.

Voltando a si, Theodor se esquivou a tempo de evitar um ataque com as garras de um outro Gavião-Gancho. Reconheceu o lugar a volta e gritou para Ivor:

- Por ali!

- Certo...

Theodor desembainhou sua espada prendendo o arco com as pernas e rechaçou as aves que continuavam a investir contra eles. Nisso, Ptah conseguiu colaborar. Dando um looping para trás na hora em que quatro gaviões atacaram, fazendo com que dois deles quase se chocassem um contra o outro tendo de se esquivar com acrobacias complexas, usando as garras Ptah dilacerou as asas de um deles e Theodor devolveu o corte em seu braço nas costas de uma das criaturas.

Eles eram cerca de duas vezes menores que Ptah, mas três vezes mais ágeis. Atacando com muito mais velocidade, enquanto a águia sobrecarregada lutava para se esquivar e se distanciar dos seus agressores. Um dos Gaviões-Gancho emparelhou com ela e rasgou os músculos sob sua asa, mas teve sua cabeça degolada pela lâmina impiedosa de Theodor. A cabeça inerte ainda presa na carne de Ptah soltou-se ao bater de suas asas. Ela gemeu baixinho, o sangue quente escorria pelo seu peito e gotejava.

- Estamos quase lá – disse Theodor tonteando. O sangue continuava a correr para fora de seu corpo.

- Você está pálido! – espantou-se Ivor.

- Não se preocupe... – mais um gavião investiu contra ele tentando arrancar sua cabeça do resto do seu corpo, mas Theodor revidou atingindo a criatura onde deveria estar o coração, entre as costelas, e matando-a. O sangue verde-metálico espirrou no rosto de Theodor o misturou-se ao seu próprio –... comigo! Preocupe-se com sua ave.

Agora que era possível contar, ele contou oito criaturas remanescentes. Viu que estavam perto da teia, e tinham de acabar logo com aquelas criaturas antes que ele morresse por falta de sangue. Ou Ptah fosse abatida.

- É ali... Vire ali!

Ivor obedeceu, e puxou as rédeas de sua montaria fazendo com que ela fizesse uma curva brusca e virasse para dentro da fenda. Os gaviões a seguiam de perto.

- Agora! – Gritou Theodor – Suba!

A alguns centímetros da teia colossal que cobria toda a extensão daquela fenda Ptah deu uma guinada para cima, espirrando sangue contra os grossos fios de teia, com um solavanco que quase derrubou Theodor da sela, se não fosse pelas fivelas que o mantinham preso no lugar. Os gaviões desprevenidos, e no ímpeto do ataque, convergiram contra a teia e lá ficaram grudados. Debateram-se aterrorizados e gritaram, piavam alto e se contorciam de pânico, cada vez mais presos à teia. Cada esforço extra por parte deles era um a menos que seu predador teria que fazer.

Ivor e Ptah comemoraram com um urro em harmonia, um pio agudo e ressonante. Theodor apenas sorriu tonto. Descendo, os três retomaram o rumo. Os olhos de Theodor piscavam demoradamente, despedaçando sua visão em cenas entrecortadas. E antes de perder a teia de vista teve certeza de ter discernido ao longe uma aranha enorme e cinzenta, com grandes bolsas amarelas sob o ventre, correndo velozmente, dependurada por um único fio de teia indo inspecionar seu banquete, enquanto ainda estava fresco. E foi a última coisa que viu antes de embainhar sua espada e desabar nas costas de Ivor, ainda segurando seu punho de madeira...

~*~*~*~

Theodor acordou titubeante, com a voz de Ivor invadindo seus desvarios. Ele conversava com Ptah numa língua estranha, pronunciada demoradamente, aproximando-se de um sonoro sopro.

- Azhen wey waza tzeray, heas flain wetrozius wen intraz…

Ao que a águia respondeu com um pio longo e ameaçador. Foi então que Theodor se preocupou a olhar ao redor para descobrir onde estava. Viu então que ainda era de tarde, pois o sol queimava-lhe o rosto exposto. Estava montado sobre Ptah atrás de Ivor, amarrado na sela para que não caísse. Seu braço cortado fora enfaixado do ombro até sua mão com uma atadura branca manchada de sangue, bastante apertada por sinal.

À sua esquerda estavam as montanhas que compunham a Cordilheira Sangrenta, abaixo deles uma floresta virgem brilhava como um mar de esmeraldas. As copas das árvores encharcadas da água da chuva refletiam a luz do sol do meio-dia como se tivessem sido bordadas com diversas pedras preciosas, enquanto o vento açulava suas folhas dando movimento e vida as suas copas. Um arco-íris se formava sobre a floresta cortando o céu num meio círculo poli cromático, tingindo com as suas sete cores o céu límpido daquela tarde.

Theodor tentou pôr-se ereto sobre a sela, estalando o pescoço ao se levantar. Uma sombra negra anuviou sua visão e o deu a impressão de estar em queda livre. A vertigem passou após alguns segundo quando Ivor disse:

- Ahá, acordou então! – disse contente, virando o corpo para trás para poder observar Theodor.

Este resmungou algo ininteligível.

- Deve saber que este é nosso último dia de viagem. Perdestes muito sangue, cuidei de você e de Ptah e em algumas horas chegaremos a Orull. Dormistes por quase um dia inteiro! Espero que esteja melhor.

- Minha cabeça está latejando, tal como meu braço. Mas vou sobreviver, já sofri ferimentos piores.

- Vou voar baixo para respirar um ar fresco e diminuir a pressão...

- Certo.

- Fará com que se sinta melhor.

Theodor teria agradecido, mas preferiu não prolongar a conversa. Ao comando de Ivor, Ptah parou de bater as asas e deixou-se levar por uma corrente de ar que se deslocava sob ela estufando suas asas. As penas de sua cauda estalavam, chicoteando ao sabor do vento, chocando-se umas com as outras. Aos poucos ela foi se afastando das montanhas, e se pondo sobre as árvores da floresta. O dia estava bem quente, diferentemente do anterior, a chuva enlameou todo o solo, e deu brilho as plantas, deixando o dia mais claro e agradável.

Um rio cortava a floresta, correndo para o oeste, em direção ao mar, e abria espaço entre as árvores. De modo que Ptah pudesse sobrevoá-lo bem de perto, quase tocando a água com suas garras pontiagudas. Criaturas selvagens corriam fazendo estardalhaço ao vê-la se aproximar. Eles estavam agora na altura das árvores, Theodor começou a lembrar da região, vendo dessa perspectiva era sem dúvida bem mais fácil.

As plantas que margeavam o rio eram grossas e tinham suas raízes suspensas, alguns animais se escondiam debaixo delas, fazendo tocas temporárias e alimentando seus filhotes. Macacos saltavam de galho em galho com seus braços e rabos ágeis, seguindo Ptah a certa distância gritando e gesticulando em sua direção com caras irritadas. Pardais e sabiás gritavam em alerta, deixavam seus ninhos e voavam para árvores mais distantes quando ela passava.

Mais a frente, no rio, seguia uma canoa com dois homens. Eles estavam sem camisa exibindo a pele morena de sol, chapéus cobriam-lhes as cabeças e em suas mãos seguravam varas de pesca. Seus peitos tinham sido pintados com tatuagens vermelho-alaranjadas tribais. Olharam assustados e admirados para Ptah quando ela passou arrancando o chapéu de um deles com o vento de suas asas. Em seguida passaram por uma clareira aberta em uma das margens do rio. Algumas casas de madeira haviam sido construídas ali, a alguns metros da água, longe da área de alagamento. Crianças brincavam de pega-pega sobre as folhas secas que cobriam o solo. Algumas mulheres quase nuas, usavam apenas saias, nada que cobrisse suas mamas. Elas pararam de cuidar de suas hortas ou de seus varais para olharem para Ptah. Algumas carregavam bebês nas costas, presos em uma grande faixa de pano amarrado sobre os ombros. As crianças, essas completamente nuas cobertas apenas por tatuagens menores, semelhantes às dos adultos na canoa, riam, gritavam e apontavam também em sua direção.

Theodor olhava para as crianças e mulheres da pequena aldeia com tanta admiração quanto elas os olhavam. Via sua vida passar diante de seus olhos, em flashes verde-folha. A natureza se espelhava naqueles rostos, naqueles olhos verde-mel, naqueles cabelos trançados com cipós e galhos, naqueles arcos e flechas empunhados por mãos que não desejavam sangue, apenas algo para comer.

A aldeia foi deixada para trás rapidamente enquanto Ptah se erguia novamente no céu. O sol se alongava para o oeste em direção ao horizonte .E hoje, mesmo de dia já se podia ver a lua no céu, branca como as nuvens, que aos poucos foram tomando a coloração arroxeada do sol poente. Enquanto no horizonte por trás das árvores já se podia avistar a enorme área de plantio que cobria todo o leste da muralha de Orull, e ao mar que agora já estava nítido diante de seus olhos, há apenas alguns minutos. O rio que seguiam dobrou para a direita e era ele que limitava a área cultivável, comandada por alguns poucos fazendeiros. As muralhas da grande Orull se erguiam imponentes em direção ao céu.

Theodor olhou ansioso em direção à cidade, seu corpo implorava por terra firme e boa comida, e em Orull com certeza conseguiria ambos.

- Aqui estamos nós. Zazuz wasuswe Ptah – ao que a águia respondeu com um incompreensível, ao menos para Theodor, conjunto de pios e zumbidos guturais.

- Ivor...

- Sim?

- Que língua, se é que se pode chamar assim, é essa com a qual se comunica com Ptah?

- Ah claro, nós falamos a língua dos seres alados, e do vento... Auran – respondeu com simplicidade.